METAMORFOSES NA DELIBERAÇÃO DO CONSUNI IMPÕEM O REUNI COMO FATO CONSUMADO NA UFRJ II
Tomei emprestado o título do artigo escrito pelo prof. Roberto Leher e publicado no Jornal da ADUFRJ e também neste BLOG. O conteúdo do mesmo, questionando se a portaria do Reitor não teria extrapolado a deliberação do CONSUNI sobre as atribuições da comissão, valeu uma consulta, formulada pelo próprio Reitor, à Comissão de Legislação e Normas a qual ainda não foi tornada pública. O procedimento adotado pelo Reitor, reduzindo uma questão política a uma questão administrativa, produz, ao mesmo tempo, frustração e inquietação. Frustração porque tudo o que o prof. Leher deseja, assim como boa parte da comunidade universitária, é discutir com mais profundidade os impactos da reforma proposta pelo REUNI, o que está colocado de forma muito clara no trecho seguinte de seu artigo - O mais sensato parece ser retornar a deliberação original de 26 de abril, de modo que a Comissão avalie e organize o debate sobre o REUNI na UFRJ. É crucial também que as Congregações não deixem de se pronunciar sobre a necessidade de que a completa reestruturação da UFRJ seja ampla e democraticamente discutida em todos os âmbitos da UFRJ, com base em um calendário que assegure o debate. E inquietação, porque dependendo do parecer da CLN abre-se caminho para instauração de sindicâncias, mais provavelmente contra o próprio professor do que o Reitor. Não faria tal comentário se não tivesse presenciado em reunião do CONSUNI, presidida pelo atual Reitor, o decano do CCJE opor-se a um parecer da CLN sobre a nulidade de um concurso, incluindo nas suas teses a condenação dos relatores e da diretora da unidade envolvida. Dado que o seu parecer foi aprovado, está aberto o caminho para que pessoas sejam responsabilizadas por suas opiniões e convicções, o que é profundamente anti-democrático.
O encaminhamento da discussão do REUNI pelo comando da comissão não se deu sem desconforto de alguns integrantes da própria Comissão, o prof. Luiz Antônio Cunha (FE) manifestou suas restrições à imediata solicitação de projetos às unidades, sem antes buscar um consenso sobre o princípios do decreto, o prof. Vainer(IPPUR) assina com restrições o relatório final da Comissão. Os percalços que as reuniões do Conselho Universitário têm enfrentado em suas últimas sessões, por causa do REUNI, são consequências da estratégia de fato consumado e pressão política sobre as congregações para aprovar projetos assemelhados com os princípios governamentais. Em 14 de junho os estudantes ocuparam o recinto de reuniões do CONSUNI, provocando a interrupção da pauta ordinária e promovendo um debate aberto sobre as questões de evasão, vagas, e demais condições da universidade. No dia 28 de junho o tema REUNI obstrui novamente o restante da pauta. E, finalmente, no dia 12 de julho, foi lido o Relatório Final da Comissão do PDE, sem, entretanto, ter havido tempo para debate-lo, marcando-se nova reunião exclusiva para essa finalidade, para o dia 19 de julho. O vídeo da sessão de apresentação do relatório está na página do CONSUNI , http://www.consuni.ufrj.br/ e a ADUFRJ mandou para seus associados os arquivos com o texto e anexos do relatório. O conteúdo deste relatório corresponde a mais uma série de metamorfoses destinadas a impor à UFRJ o que ela não decidiu – adotar ciclos básicos abrangendo CT-CCMN, CCJE-CFCH e CCS por um lado, e bacharelados interdisciplinares por outro.
As metas principais do REUNI, um decreto presidencial, são a duplicação, na média, do número de vagas nas IFES e a titulação de 90% dos alunos entrantes (redução da evasão). Os membros da comissão, ao início de sua missão, bradavam em todos os quadrantes da universidade contra a absurdamente baixa relação professor-aluno na UFRJ e o incipiente índice de formandos com respeito aos alunos matriculados. Invocaram-se os exemplos da Argentina, Europa, Cuba, enfim o que fosse necessário para demonstrar o quanto estávamos aquém do ensino superior universal. Em tardio artigo no Jornal da UFRJ o próprio Reitor vem em defesa do decreto, citando a necessidade de duplicar, ou mesmo triplicar as vagas nas IFES. É com surpresa, portanto, que se lê à página 8 do Relatório Final, o seguinte trecho: Somos uma universidade de ensino e pesquisa. Somos uma Universidade com um sistema de Pós-Graduação que figura dentre os melhores do país. Seria insensato exigir de universidades com estas características as mesmas taxas, relativas à graduação, que são exigidas de Universidades, componentes do Sistema Federal de Ensino Superior, que só se dedicam, por exemplo, ao Ensino de Graduação ou que ainda apresentam um sistema de Pós-Graduação incipiente. Partimos, portanto, do princípio que as metas estabelecidas no Decreto são médias nacionais para a graduação e que, no caso da UFRJ, estes números, pelo menos aquele que se refere à relação aluno/professor, pelas razões já citadas, deve ser, necessariamente menor no caso da UFRJ. Levando-se em conta que temos, hoje, cerca de 10.000 (dez mil) alunos de Pós-Graduação, calculamos uma relação ponderada entre alunos de graduação e pós-graduação, onde arbitramos um peso 3 para estes últimos. Nesse cálculo, a taxa atual aluno/professor da UFRJ, eleva-se para cerca de 20:1. O peso 3 foi arbitrado levando-se em conta uma média calculada a partir das relações aluno/professor recomendadas pela CAPES, diferente de acordo com as especificidades das áreas. Escolher 14:1 para nossa relação aluno de graduação por professor é uma decisão política que podemos assumir e como ela é adequada, tendo em vista nosso peso específico no cenário nacional, propomos à Reitoria que inicie negociações com o MEC, para que esta relação seja aceita. Ou seja o demônio de ontem, reduziu-se a um gatinho manso? Mas fomos também assombrados pelo estigma da evasão, causado principalmente pela precocidade da escolha profissional. No projeto de Bacharelado em Ciências da Natureza e Matemática, à página 3, lê-se: A evasão e a retenção dos estudantes nos cursos superiores é um dos grandes problemas enfrentados pelas Instituições de Ensino Superior, sejam elas Públicas ou Privadas, sejam elas brasileiras ou estrangeiras. Diversos são os fatores responsáveis por este problema. Várias atividades de pesquisa e ensino têm sido desenvolvidas com o objetivo de detectar e apresentar propostas para reduzir a evasão no ensino superior. Estes trabalhos apontam para diversos problemas, destacando-se como mais importantes: a)Problemas sociais, em função da origem do candidato, que, via de regra, necessita entrar no mercado de trabalho para auxiliar financeiramente a família; b)A imaturidade, que faz com que a escolha pela carreira profissional seja feita prematuramente, com o estudante muitas vezes não tendo a menor idéia dos atributos necessários para o desenvolvimento de uma determinada profissão. O item b) serviu então de base para a proposição dos assim chamados Bacharelados Interdisciplinares. É novamente, com surpresa, que se lê no Relatório Final da Comissão do PDE : No caso da taxa de conclusão, prevemos, ainda a partir das propostas provenientes das Unidades que ao final de cinco anos ela esteja próxima de 80% o que já indica um esforço considerável para a redução das taxas de evasão e integralização curricular pelos alunos. Esta taxa poderá se elevar ainda mais tendo em vista as iniciativas que o CEG vem tomando nesta direção. Parece ótimo demais ! Tudo se resolveu, mais alunos e mais formandos a partir de iniciativas simples, coerentes, oriundas do interior de cada unidade...No entanto à página 12 temos a seguinte recomendação intempestiva: Segundo avaliação da Comissão, esses números poderão ser, ainda, consideravelmente aumentados com a implantação de básicos por grandes áreas, conforme manifestação de concordância de várias unidades do CT/CCMN, CCJE/CFCH e CCS e a efetiva implantação de novos pólos de interiorização. Neste cenário, poder-se-ia estimar um total de 52.000 alunos de graduação até 2015. E mais adiante à pagina 14 : As Unidades manifestaram seu interesse em caminhar na direção de cursos envolvendo inovações nas práticas pedagógicas, regimes acadêmicos e modalidades de diplomação, a partir, em vários casos, da implantação paralela de Ciclos Básicos comuns por grandes áreas. Em algumas propostas é vislumbrada uma única entrada com possibilidade de múltiplas saídas, de maneira a contemplar novos perfis de formação universitária que atendam a evolução tecnológica e social do mundo atual e o compromisso com a formação do cidadão. Tendo em vista a diversidade e diferentes níveis de elaboração das propostas, a Comissão decidiu recomendar que a UFRJ, caso delibere encaminhar Proposta REUNI UFRJ ao MEC, elabore uma proposta constituída por diferentes módulos, a serem gradualmente implantados e avaliados, permitindo eventuais correções de rumo. Os módulos deveriam ser os seguintes: MóduloI- Implementação das propostas provenientes das Unidades (2008-2012); Módulo II- Implantação de Ciclos Básicos Comuns por grandes áreas, a saber: CT-CCMN, CFCH-CCJE e CCS - (2010-2012); Módulo III- Implantação de novos cursos inovadores em termos de práticas pedagógicas, regimes acadêmicos e formas de titulação (2012-2015).
Em que momento as precárias discussões nas unidades, por um lado, e os documentos oficiais PNE, PNG, PDI (não aprovado pelo CONSUNI), por outro, apontaram para a necessidade de mega ciclos básicos e bacharelados interdisciplinares é um mistério a decifrar. Pois, de acordo com o próprio relatório, as questões da relação professor-aluno e evasão foram resolvidas por outros meios. A sua inclusão no relatório é um enxerto que nos remete de volta ao início de todo o processo. Ou se discute em profundidade com a comunidade universitária em um amplo Congresso Interno do que estamos falando, ou os impasses retornarão na forma pior em que podem se manifestar – colapso do sistema de ensino superior federal.
Um comentário:
A reunião extraordinária do CONSUNI, do dia 19 de julho, encerrou de forma grotesca a discussão sobre o relatório da Comissão do PDE - cerca de vinte alunos manifestando-se ruidosamente no centro da sala de reuniões, enquanto aos gritos o reitor convocava os vinte e tantos conselheiros a ficarem de pé e votarem a aprovação do REUNI...
A responsabilidade por reduzir a uma ópera bufa o momento culminante do processo de elaboração da reestruturação da UFRJ não deve ser, entretanto, creditada, unicamente, ou mesmo, principalmente, aos estudantes.
O encaminhamento pelo Reitor da discussão e votação em termos de se aceitar ou rejeitar o relatório levou ao acirramento de ânimos e ao sentimento de frustração tanto de conselheiros como de representantes de funcionários e docentes presentes ao Conselho.
Se os estudantes foram pueris, muitos conselheiros também o foram. Ao comemorarem a aprovação de todas as recomendações da comissão, inclusive a criação de mega ciclos básicos nos Centros CCMN-CT; CCJE-CFCH e CCS, arriscam-se a enfrentar a frustração por verbas não concretizadas e pelo colapso do sistema de ensino superior. Decidiram isso no dia 19 de Julho em meio ao recesso escolar, esquecem-se que terão de se haver com as consequências pelo resto de suas vidas acadêmicas.
Se a estratégia de aprovar em bloco o relatório foi vitoriosa em termos de ganhar a votação, do ponto de vista da discussão foi uma estratégia medíocre. Pois teria sido perfeitamente possível fazer destaques e aperfeiçoar algumas recomendações e eliminar outras, totalmente descabidas. Desta forma as boas recomendações tornaram-se reféns das más, o que não contribuirá para um apoio amplo à reforma pretendida. A isso some-se a vocação para o caos do atual governo federal e teremos a receita do desmantelamento das IFES a exemplo do que ocorreu com o ensino médio público - o verdadeiro gargalo para o ensino superior. Mas isso não preocupa os grupos que criaram verdadeiros bunkers dentro das IFES aonde administram seus projetos de pesquisa e consultoria à margem da universidade. Em troca de seu apoio basta dar-lhes mais verbas e projetos...
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