REÚNICO – para onde descaminha a UFRJ?
Luis Paulo V. Braga
Para quem acredita que o REUNI é a solução definitiva para o acesso bem sucedido das camadas populares ao ensino superior público, nada mais natural que no dia 19 de julho, dia dos povos oprimidos, se aprovasse no Conselho Universitário da UFRJ(CONSUNI) o relatório elaborado pela Comissão designada pelo Reitor e CONSUNI para avaliar o PDE. Fins tão nobres poderiam justificar, a principio, os meios nada nobres utilizados para conseguir sua aprovação em tempo recorde . Entretanto, o relatório principia admitindo não ter cumprido sua missão principal – avaliar o PDE.
Uma lástima para uma comissão que, dentre vários projetos, aprovou a criação de um curso em Gestão de Políticas Públicas para o Desenvolvimento Econômico e Social, de autoria de um dos membros da própria Comissão. Poderiam ao menos ter lido o documento de análise preparado pela Confederação Nacional dos Trabalhadores na Educação (CNTE), filiada à insuspeita CUT, sobre o PDE. Em suas conclusões destaca : "A CNTE entende que um projeto de educação comprometido com a transformação da atual realidade deva partir de algumas premissas elementares, sem as quais seus objetivos acabam se desvirtuando. Dentre elas, destacamos: i) o papel estratégico da educação no projeto de desenvolvimento sustentável para o país; ii) a participação social e; iii) a garantia de plena execução; cabendo ao Estado a condução das políticas públicas e à sociedade o envolvimento pleno nas ações. Embora o Governo tente disseminar a idéia de um plano para a educação vinculado a outro para o desenvolvimento (PAC - Programa de Aceleração do Crescimento), a estrutura de ambos não permite considerá-los projetos de desenvolvimento, uma vez que não tratam de questões estruturais, mas de ações conjunturais e focalizadas – no caso da educação, meritocráticas e duvidosas. Conseqüentemente, ao nosso ver, falta-lhes o caráter sistêmico das políticas públicas, com idéias e eixos de ações interligados às diversas áreas de Estado, visando atingir objetivos e resultados não apenas quantitativos, mas qualitativos; de rompimento paradigmático; de amplo desenvolvimento social e não apenas econômico."
A justificativa apresentada para não avaliar o PDE, restringindo-se a apenas alguns programas (REUNI, Acessibilidade ao Ensino Superior e Banco de Professores Equivalentes), foi o fator tempo para inclusão no orçamento de 2008. Curiosamente a ANDIFES parece não ter a mesma urgência. A Diretoria Executiva da Andifes esteve reunida, na terça-feira (10/07), com o secretário da Educação Superior (SESu/MEC), Ronaldo Mota. O encontro tratou de questões emergenciais das Instituições Federais de Ensino Superior (Ifes) e do Plano de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais (Reuni). Estiveram presentes, também, a diretora do Departamento de Desenvolvimento da Educação Superior (Dedes/SESu), Maria Ieda Costa Diniz, e o secretário-executivo da Andifes, Gustavo Balduíno. O presidente da Andifes, reitor Arquimedes Diógenes Ciloni (UFU), deu início à reunião repassando ao secretário Ronaldo Mota documento elaborado pela Associação com os questionamentos das Ifes a cerca Reuni. O Ministério da Educação analisará as questões apresentadas e oferecerá respostas durante o seminário que realizará no final deste mês (julho) sobre o tema. Sobre essa questão, o professor Arquimedes Ciloni informou, ainda, que a Andifes realizará, no dia 07 de agosto, um seminário interno sobre o Reuni com o objetivo de proporcionar aos dirigentes o amplo debate. Na LXIVª reunião ordinária do Conselho Pleno, que ocorrerá no dia seguinte, será aprovado o conjunto de sugestões da Andifes para o aprimoramento do Reuni. O cuidado e o zelo demonstrado por esses dirigentes contradiz o que consta na página da Universidade Federal da Bahia aonde se afirma que a ANDIFES aprovou o REUNI, infelizmente, a outra notícia – a de que na UFRJ apenas a ESS não havia aderido ao REUNI é verdadeira.
Qualquer dirigente, com um mínimo de experiência e conhecimento de história da educação superior no Brasil, sabe dos efeitos nefastos de planos aprovados a toque de caixa sobre um sistema tão complexo, como o do ensino superior. Não foi por acaso, que o único membro especialista em Educação da Comissão, colocou-se contra a aprovação do relatório pelo CONSUNI, tecendo críticas à metodologia adotada.
Externamente à UFRJ, reitores, membros de conselhos também expressaram suas críticas. O prof. Thompson Fernandes Mariz, Reitor da Universidade Federal de Campina Grande afirma: O que, de imediato, nos preocupa no Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais é a sua meta nada modesta: "a elevação da taxa de conclusão média dos cursos de graduação presenciais para noventa por cento e da relação de alunos de graduação em cursos presenciais por professor para dezoito, ao final de cinco anos". Esta preocupação aumenta bastante quando lembramos que o Decreto em referência é fruto do Plano de Desenvolvimento da Educação – PDE, que tem como escopo a duplicação da oferta de vagas no ensino público superior. Como o Plano de Reestruturação não pode estar descontextualizado do Plano de Aceleração do Crescimento – PAC, que prevê, para os próximos dez anos, uma significativa limitação na expansão das folhas de pagamentos, não permitindo aumento superior a 1,5% por ano, o objetivo do REUNI se revela assustador. Nesta hora percebemos que o aparentemente inquestionável objetivo do REUNI de ampliar o acesso e a permanência na educação superior se dará pelo muitíssimo questionável "melhor aproveitamento da estrutura física e de recursos humanos existentes nas universidades federais". Duplicar a oferta de vagas e aumentar, pelo menos em 50%, o número de concluintes, a partir de um incremento de apenas 20% das atuais verbas de custeio e pessoal (excluídos os inativos!) é a indicação sub-reptícia de que a reestruturação proposta pelo Decreto Nº. 6.096 cobra uma subutilização dos recursos existentes nas Universidades Federais e aponta somente dois caminhos para o cumprimento de sua meta global: a aprovação automática ou a certificação por etapas de formação.Mas será que, para resolver estes problemas, temos que necessariamente optar por uma "diversificação das modalidades de graduação, preferencialmente não voltadas à profissionalização precoce e especializada"? Não estaríamos, assim, indo na contramão do modelo pactuado no Tratado de Bolonha, que propõe uma circulação do conhecimento mais rápida e ampla para conquistar os jovens que estavam fugindo do meio acadêmico para ir para o mercado de trabalho, mais atrativo do que os cinco anos indispensáveis para se obter uma graduação, ou os dez ou doze anos necessários para se formar um doutor? O certo é que a aprovação automática se contrapõe a qualidade sempre defendida para a educação nacional e a certificação por etapas mascara a atual evasão sob o discurso perverso – porque enganoso! – da inclusão social. Não temos dúvidas de que uma saída fácil para o cumprimento da meta de elevar a taxa de conclusão para noventa por cento do ingresso seria optar pela certificação por etapas. Ao aluno que concluir uma etapa de sua formação global dá-se um certificado e contabiliza-se esta certificação como uma conclusão. Alguns egressos da primeira fase de formação migrarão para a fase seguinte de formação, outros, por falta de condições competitivas, "serão migrados" para o mercado de trabalho, precocemente, porque ainda estarão sem uma profissão. Resta saber que tratamento o mercado de trabalho, a cada dia mais competitivo, dará aos egressos do ensino superior que, apesar de poderem demonstrar capacidade de expressão e de raciocínio lógico, conhecimento de ética, política e filosofia, domínio de técnicas da informática, e espírito empreendedor observado na criatividade e flexibilidade de suas iniciativas, não tenham um diploma de graduação, nos moldes estabelecidos pelas Diretrizes Curriculares Nacionais, ainda em vigência, e exigidos pelos Conselhos Profissionais, cada vez mais atuantes na definição do perfil do profissional. Não estamos discordando da necessidade de se reestruturar o ensino superior, de se evitar a evasão desenfreada, de se ocupar as vagas ociosas, de se ampliar a oferta de vagas, notadamente no turno noturno. Tampouco estamos fugindo da responsabilidade que nos cabe neste processo de revisão da estrutura acadêmica e de atualização das metodologias de ensino. Apenas esperamos uma revisão que contemple a adequação das metas do Programa às ferramentas disponibilizadas para o seu cumprimento, para que não caiamos simplesmente na redefinição da função da Universidade. Por fim, fica a pergunta inevitável: para onde caminhará uma Instituição que resolva não aderir ao Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais, uma vez que o Ministério da Educação estabelecerá parâmetros de cálculo dos indicadores que compõem a meta global do REUNI?
O presidente do Conselho nacional de Educação, Edson Nunes, em entrevista à Folha Dirigida também expressa suas preocupações: "Os recursos para o Reuni são importantes, mas a parte preocupante é o estímulo à massificação da educação pelo setor público. É preciso investir na excelência do ensino público, mas do que na massificação. Me parece que o próprio Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE) não traz estímulos para tal. Somos a décima economia do planeta e as nossas universidades deveriam refletir isso. Temos potencial para isso".
Ora, se os fins nobres do REUNI ainda estão por se esclarecer. O que justificou na UFRJ tanto açodamento na sua aprovação ? Seria mais um caso de os meios justificam os meios ? As metamorfoses da Comissão, tão pertinentemente analisadas pelo prof. Leher em seus antológico artigo no Jornal da ADUFRJ, a ponto de levar o Reitor a abrir uma sindicância, seriam justificadas por verbas que, aparentemente, outras IFES ainda estão por considerar ?
No dia 19 de julho o CONSUNI aprovou, por ampla maioria, um relatório que tem um cronograma de implantação do paradigma da Universidade Nova – grandes ciclos básicos e bacharelados generalistas de curta duração. Sabendo que estas idéias foram rejeitadas, ou não foram discutidas na maioria das unidades, o CONSUNI deu um golpe na comunidade universitária. Por quê tanta determinação em uma corrida se, aparentemente, as outras IFES ainda não estão participando em vista do principio da prudência ?
O orçamento da UFRJ não fecha. É o próprio prof. Levi, Pró-reitor de desenvolvimento, que nos informa que a esperança de eliminar o deficit de custeio de 50 milhões de reais e a realização de investimentos previstos no PDI da ordem de 115 milhões dependem da aprovação do REUNI. Portanto o princípio, o meio e o fim são um só – dinheiro a curto prazo em troca de compromissos a longo prazo. Para o governo federal o REUNI representa dividendos políticos e menos despesas por aluno nas IFES. No entanto para o país, para os alunos e professores representa ensino de menor qualidade, porque se não há mágica nem na prestação de serviços, quanto mais na educação. Diante do quadro caótico em que se encontra mergulhado o governo federal, não constituirá nenhuma surpresa se as negociações sobre o REUNI arrastarem-se por todo o resto do ano, e então teremos gasto nossas energias e tempo em vão, mais uma vez...
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