quarta-feira, 11 de julho de 2007

Duplos desafios não podem ser vencidos com meias verdades


A poderosa Coordenadoria de Comunicação da UFRJ, que conta com 37 profissionais e 23 estagiários, distribuídos em divisões de assessoria de imprensa, mídias diversas e relações públicas, criada pela atual Reitoria da UFRJ, produz um jornal mensal impresso, Jornal da UFRJ (20.000 exemplares), através do qual a comunidade da UFRJ vem recebendo a versão oficial do que ocorre na universidade. Em particular o número 27 traz duas matérias sobre o REUNI , sendo uma delas a entrevista concedida pelo Reitor ao Jornal com o título - o duplo desafio da Universidade.

A primeira pergunta parte de um pressuposto – o acesso de jovens ao ensino público superior parece ser um gargalo quase intransponível. Por quê ? A resposta do dirigente baseia-se em estatísticas do Brasil – apenas 10% dos jovens entre 18 e 24 anos têm acesso ao ensino superior... E estatísticas internacionais – Em Cuba, mais de 50% dos jovens estão cursando a universidade. Ora, no Brasil menos de 45% dos jovens na faixa etária de 15 a 19 anos cursa o ensino médio, cerca da metade disso conclui o ensino médio, enquanto que em Cuba mais de noventa por cento dos jovens nessa idade está cursando o ensino médio, tornando-se potencialmente aptos para acessar o ensino superior. Não há deficit de vagas no ensino superior brasileiro, a relativa incipiencia de matrículas se deve ao gargalo do ensino médio. O viés da pergunta-resposta cumpre os objetivos da entrevista que são os de propagandear mais uma vez o REUNI e suas discutíveis virtudes.

Após historiar a evolução da educação superior no Brasil como uma sucessão de arremedos destinados a preservar os interesses de uma elite mesquinha e míope, considera que urge dobrar e até triplicar as matrículas nas universidades públicas, eliminando o vestibular, que segundo o Reitor, não seleciona mérito, mas renda, favorecendo aos filhos das classes médias. Ao reduzir a uma leitura classista o processo de formação de quadros de nível superior no Brasil, o Reitor exterioriza duas conclusões polêmicas - estigmatiza a classe média, negando aos seus filhos, apesar dos impostos pagos, a legitimidade do acesso ao ensino público gratuito; e compromete a produção ao partidarizar a formação de quadros técnicos e científicos. Ao favorecer a universalização do ensino superior por decreto o dirigente arrisca-se a fazer a roda da história passar sobre o seu próprio pé, pois não se vislumbra outro desdobramento, com o rebaixamento da qualidade do ensino superior, que não seja o enfraquecimento da sociedade brasileira diante da globalização.

Para o Reitor o REUNI não é exatamente uma novidade, porque muitas das metas e diretrizes contidas no decreto que criou o programa já estavam presentes no PDI que , segundo ele, foram amplamente discutidas pela comunidade universitária em 2006. Ora o debate sobre o PDI foi meramente formal a partir de uma agenda previamente estabelecida pela Reitoria. Nas visitas itinerantes às unidades as discussões, muitas vezes, se resumiram a pedidos de vagas, de recursos, de instalações, etc... O PDI jamais foi debatido no CONSUNI, nem foi adotado pela comunidade da universidade. A questão da interiorização da UFRJ, por exemplo, nunca constou do PDI, no entanto, é um dos destaques da entrevista do Reitor, em particular os projetos em Macaé, que nos casos da Farmácia e Licenciatura em Química não contam com recursos reais de pessoal, como se constatou na reunião do CONSUNI de 28 de junho.

O saldo da primeira rodada do REUNI na UFRJ ficou bem aquém dos objetivos para o qual foi criado. Apesar do sucesso anunciado pelos coordenadores da Comissão do PDE, a maioria dos projetos apresentados corresponde à criação de cursos noturnos, de expansão de vagas, e um ou outro curso de natureza interdisciplinar. A maior motivação para a adesão ao programa é a possibilidade de obter mais recursos orçamentários, críticos para estancar o deficit do custeio, por um lado, e para investimentos em obras tais como novas salas de aula, refeitórios, como bem detalhou o pró Reitor de Desenvolvimento, por outro. Isto não parece satisfazer o Reitor que propõe uma nova rodada do REUNI até setembro - prazo para o envio de propostas consolidadas ao MEC. Dentre algumas metas anunciadas pelo Reitor estão : a implementação do banco de professores equivalentes, a relativização da autonomia e o fim dos departamentos. O procedimento para a próxima fase de discussões será através de audiências públicas, o que é uma forma muito limitada de participação. As sessões públicas da Comissão do PDE já demonstraram isso, o público não compareceu porque não havia aonde sentar, e mesmo os professores que expuseram os seus projetos tiveram, muitas vezes, a palavra cortada. A melhor alternativa já foi proposta por estudantes e professores - é a realização de um Congresso Interno da UFRJ com a suspensão das aulas para que a maioria dos estudantes, professores e funcionários possa participar.

2 comentários:

Leandro Nogueira disse...

Uma crônica fiel acerca da menoridade intelectual que predomina na Reitoria da UFRJ e que impinge o REUNI contra a comunidade acadêmica e as reais necessidades da sociedade brasileira.
Um texto memorável que nos convida ã resistência contra o casuístico decreto que premedita a banalização do ensino superior nas IFES.

Luis Paulo disse...

Na reunião do CONSUNI do dia 12 de julho foi lido o relatório da Comissão do PDE. Apesar da esmagadora maioria dos projetos contemplarem apenas o aumento de vagas noturnas ou diurnas e a criação de alguns cursos novos, a comissão insiste em colocar a questão dos ciclos básicos por centro e dos bacharelados interdisciplinares. Para torná-los mais palatáveis propoe fazelo em etapas. O relatório da comissão será votado no dia 19 de julho em reunião exclusiva do CONSUNI.