terça-feira, 30 de outubro de 2007

Olha só quem está falando !

Olha só quem está falando !

“Se podes olhar, vê. Se podes ver, repara”
in Ensaio sobre a Cegueira, de José Saramago


  • O descaminho do REUNI na UFRJ começou em Maio de 2007 graças à imposição pelo Reitor de uma alteração na resolução do CONSUNI que propunha constituir uma Comissão para avaliar o PDE. A inclusão da missão de propor diretrizes para ações anulou, totalmente, o caráter crítico proposto inicialmente. De uma atitude reflexiva, para a mera operacionalização de propostas em relação a apenas uma das linhas de ação do PDE. A comissão terminou por não cumprir a tarefa para a qual foi criada – avaliar o PDE e cumpriu a tarefa adicional sob pesadas críticas. Um controvertido relatório foi aprovado no dia 18 de julho, dando origem a um documento da Reitoria denominado PRE. Após muitas sessões públicas, com pouco público, o projeto de reestruturação da UFRJ foi aprovado em duas tensas reuniões do CONSUNI. Despido das marcas emblemáticas do REUNI, graças à pressão da oposição de alunos, professores e técnicos administrativos, mas ainda com muitos vícios da sua tramitação tortuosa, o projeto será finalmente encaminhado ao MEC.
  • No rescaldo dos recentes embates brotam aqui e acolá mensagens, declarações e convocações aos docentes atribuindo à ADUFRJ-SS o papel de operador da desordem e do desrespeito na UFRJ. Acusam-na de quase tudo – de orquestrar a invasão do CONSUNI, de malversação do dinheiro dos associados e de manipulação de votos para a eleição da diretoria da entidade. Para isso invocam até personalidades do mundo literário e filosófico – de Confúncio a Saramago, passando por Antonio Machado. Como já foi demonstrado, anteriormente, os lamentáveis incidentes do dia 18 tiveram origem no despreparo da Reitoria em organizar um evento com um potencial tão explosivo, envolvendo grupos de estudantes com posições políticas tão antagônicas – reunidos uns em torno da UNE, outros em torno do CONLUTE. Ou por desleixo, ou mesmo por oportunismo, a direção superior da universidade deixou de tomar as providências elementares para garantir a segurança da reunião. Não repetiu o erro na segunda reunião, ao retirar as escadas de acesso ao palco, ao colocar uma barreira de caixas de som e convocar mais seguranças. Mas, principalmente, chamando a oposição para conversar mais seriamente.
  • Os acusadores da ADUFRJ-SS reclamam das caneladas que levaram no dia 18, mas o que está lhes doendo mais é a consciência de que no dia 25 os princípios formadores da maior universidade federal do país ainda pesarem mais que o troco fácil dos editais de ocasião. E esta dor, que deve ser terrível, solta-lhes a língua de uma maneira pior ainda, fazendo-os emitir acusações que mais desmoralizam os acusadores, por suas inconsistências, do que aos acusados.
  • A verba de R$450.000,00 que, supostamente, teria sido transferida ao CONLUTE para promover invasões em todo o Brasil foi aprovada no 52o CONAD para o Fundo de Mobilização do ANDES no período de Agosto de 2007 a Janeiro de 2009. Este ano somente foi liberado R$ 150.000,00 para dois eventos: a Jornada da Educação de 20 a 24 de agosto e a marcha do dia 24 último em Brasília, que envolveu várias categorias de sindicatos e associações. Bem diferente portanto do que está sendo relatado.
  • Uma outra acusação, a de que a recém eleita diretoria da ADUFRJ se elegeu com o voto dos aposentados, também é falsa. O percentual não ultrapassa 10% e muito nos honra esses votos por parte daqueles que em outras épocas mantiveram viva a chama da educação pública, gratuita e de qualidade. Discutíveis foram os termos em que esta reitoria se reelegeu, colhendo resultados pífios em relação às eleições anteriores. As eleições foram uma sombra daquelas realizadas em Maio de 2003 quando 16.469 eleitores compareceram às urnas, para escolher dentre três chapas concorrentes. Nas antecipadas eleições desse ano a participação foi de 10.583 votantes, representando uma queda de 35,7 % ! Por outro lado o número de votos em branco foi de 76 em 2003 e 556 em 2007 representando um aumento de 731 % ! O número de votos nulos passou de 489 em 2003 para 614 em 2007, representando um aumento de 25 % . O colégio eleitoral de 2007 para a consulta foi contabilizado em 61.212 eleitores, desses a chapa única logrou obter 9.413 votos, ou seja 15% do total da comunidade universitária.
  • O recurso à mentira não é novidade na política, o mau “marketing” político desenvolveu a níveis nunca antes vistos a “desarte” de tornar sensual o que é repulsivo. E é exatamente desta matéria que se nutre a tentativa de abrir na UFRJ a dissidência denominada – PROIFES. Pregam o fim de um sindicato a nível nacional, porque pregam o fim da rede de universidades federais, em prol de um modelo de organização social, que dará a cada universidade uma dimensão própria, divorciada de um projeto nacional, emasculada e submissa ao termos do mercado. Mentem, ao divulgar tabelas salariais futuras como sendo propostas correntes. Mentem ao inflar seu número de associados. Mentem ao negar a ingerência partidária em suas deliberações. Mentem ao dizer que mais de cem docentes se desfiliaram da ADUFRJ nos últimos dias. Mentem ao dizer que vieram servir aos docentes. Vêm isso sim, para nos tornar servis docentes.

terça-feira, 23 de outubro de 2007

"A luta continua"

“A luta continua”

Com esta velha palavra de ordem dos movimentos reivindicatórios, trinta e oito ocupantes dos cinqüenta e cinco cargos do Conselho Universitário da UFRJ encerram um manifesto dirigido à Comunidade Universitária por conta da tumultuada sessão do dia 18 de outubro último. Em tom moderado, bem distinto da iniciativa solo do Decano do CCJE, tem por objetivos, por um lado prestar solidariedade ao Reitor ( que não assina o documento), e por outro defender a legalidade e legitimidade da deliberação em favor do PRE-REUNI.

Em seu terceiro parágrafo, defende a escolha do auditório do CT como local para a reunião do CONSUNI: “O Magnífico Reitor, Presidente do CONSUNI, preocupado em garantir a transparência do processo decisório, resolveu, excepcionalmente, realizar a Sessão Extraordinária no Auditório do Centro de Tecnologia, onde haveria acomodações adequadas e seguras para todos aqueles interessados em acompanhar a votação do CONSUNI – transmitida também via Rede Mundial de Computadores (Internet).” Ora a prática demonstrou que as acomodações não são nem uma coisa, nem outra. O que já era previsível desde a reunião do CONSUNI do dia 19 de Julho que aprovou o relatório da Comissão do PDE, ensaio para o ato final da comédia ou tragédia em que se transformou a tramitação do Projeto de Reestruturação na UFRJ. O Congresso Nacional que aprova projetos bem mais polêmicos, há muito tempo protegeu os congressistas e o público, isolando as galerias, distribuindo senhas e difundindo as imagens pela TV. Nem por isso o processo que antecede as votações se tornou mais transparente, pelo menos até que se tomasse conhecimento das revelações da CPI do mensalão e do processo aberto pela Procuradoria Geral da República.
O documento continua descrevendo o exótico ambiente em que se desenrolou a reunião : “Transcorridos os trinta minutos regimentais do Expediente, o Presidente do Conselho passou ao ponto único da ordem do dia, concedendo a palavra à Presidente da Comissão de Desenvolvimento, Professora Ângela Rocha dos Santos, para a leitura do parecer relativo ao processo em pauta – a saber, Proposta de Programa de Reestruturação e Expansão. Em seguida, embora em meio a muito barulho, manifestou-se a conselheira Professora Lilia Guimarães Pougy, também integrante da Comissão de Desenvolvimento, que leu seu voto em separado. Apesar deste voto ser contrário à aprovação da proposta em pauta, não houve, da parte daqueles que se manifestavam ruidosamente, qualquer consideração pela oradora, como tampouco tinha havido em relação à exposição da Presidente da Comissão de Desenvolvimento. ” O que se esperaria então de quem presidia a reunião ? A imposição da ordem, e no impedimento, a suspensão da reunião e sua transferência para um local aonde de fato fosse seguro e adequado continuá-la.
A declaração assinada de parte expressiva do CONSUNI atesta que tanto a relatora, como a conselheira que apresentou voto em separado não tiveram as condições regimentais para apresentar seus respectivos pareceres. Ou, por acaso, nas reuniões ordinárias do CONSUNI os relatores são regularmente apupados ?
Apesar das evidências, os Conselheiros, segundo o Manifesto, apenas suspeitavam de que a reunião poderia não conseguir deliberar: “Começava a ficar claro um novo e totalmente distinto objetivo: impedir a discussão e a deliberação do Conselho.” Ora este objetivo era evidente desde o início, é, no entanto, nos momentos seguintes, que a situação de descontrole, convenientemente tolerada, como consta no documento dos conselheiros vai servir de pretexto para o rito sumário de votação: “Esta intensa e rica participação, animada e colorida por faixas e cartazes, expressava, foi este o nosso sentimento, uma primeira e importante conquista do processo, talvez a mais importante de todas: a UFRJ está despertando para o debate de seus destinos e enfrentando de maneira aberta e mobilizadora os desafios que se lhe colocam.” Apesar das condições irregulares o Reitor mantém a reunião e comete o segundo ato discutível : “ Encerrado o tempo do conselheiro Agnaldo Fernandes para apresentação de sua questão de ordem, instado por expressiva maioria dos Conselheiros, que se consideravam esclarecidos para deliberar, o Presidente do Conselho, Professor Aloisio Teixeira, colocou em votação a proposta do PRE, nos termos encaminhados pela Comissão de Desenvolvimento, ressalvadas as propostas de emenda a serem submetidas, em seguida, à discussão e votação. Por maioria expressiva e inquestionável, os Conselheiros manifestaram-se a favor do parecer e da proposta de PRE.”
Ora, o presidente do CONSUNI pode ser instado por quem quer que seja, estudantes, ou conselheiros, porém, deve seguir o rito de discussão de uma proposta. Ao votar, sumariamente, sem a aprovação do regime de urgência, acabou por fazer aquilo que a oposição queria – não discutir o PRE.
Se não houvessem dúvidas a respeito do ocorrido não estariam a proliferar manifestos atestando a legalidade e legitimidade da reunião do CONSUNI, como já foram os casos dos manifestos do CLA, do CCJE e agora do CONSUNI. Se o grupo de conselheiros em torno do Reitor considera que venceram uma batalha, aparentemente, não estão certos de terem vencido a guerra, senão por que a palavra de ordem ?




segunda-feira, 22 de outubro de 2007

A vítima que é cúmplice

A vítima que é cúmplice

Em uma carta aberta o Decano do CCJE pouco contribui para o restabelecimento da normalidade de relações entre os diversos segmentos da universidade. Prefere, ao invés, tecer difamações contra a Associação de Docentes, na pessoa de seus diretores, baseado mais em presunções do que evidências. Já no primeiro parágrafo de seu vaticínio, atribui aos dirigentes da ADUFRJ cumplicidade e tolerância para os atos perpretados no interior do auditório quando diz: “É escandaloso que professores de certa idade, ou melhor, de qualquer idade, como os que ora dirigem a ADUFRJ venham considerar aceitáveis as reações fascistas daqueles arrivistas que lá estavam. Eu gravei boa parte da agressão e também da manifestação. Agrediram dois decanos e empurraram o reitor e a vice-reitora contra a parede, além de terem ameaçado vários conselheiros.” Lendo a nota da ADUFRJ, não há em nenhuma linha apoio às ações de agressão que ocorreram, diga-se de passagem, da parte, tanto de pessoas favoráveis como contrárias ao PRE. É importante não confundir a expectativa de que a frustração diante da intransigência da Reitoria poderia ensejar reações exacerbadas, com o apoio às mesmas. Surpreendentemente o texto do Olhar Virtual é muito mais equilibrado, o relato dos confrontos é apresentado da seguinte forma: “ Estudantes vinculados a diversas correntes do movimento estudantil compareceram à sessão. Alguns deles, integrantes da Coordenação Nacional de Lutas dos Estudantes (Conlute), tentaram impedir que o Consuni deliberasse sobre a matéria. Com encenações teatrais e palavras de ordem eles interromperam as intervenções da mesa e as de conselheiros até o momento em que invadiram o palco do auditório, no qual estavam os membros do colegiado. Houve embates corporais entre esses discentes, representantes da União Nacional dos Estudantes (Une) e outros estudantes, presentes ao encontro para manifestar apoio ao PRE/UFRJ.”
Em seguida, o Decano, contrariando a sua profissão de fé democrática, refere- se da seguinte maneira à proposta de plebiscito para decidir sobre a matéria: “Não me venham, tampouco, com a história de plebiscito. Em primeiro lugar, porque, ao contrário do Conselho Universitário, onde há representantes externos da sociedade que nos paga, no plebiscito, a menos que definamos que público votante é toda a população da Zona Metropolitana do Rio de Janeiro ou um universo assim, não haverá esta representação para um projeto que, afinal, mexe com a vida de toda a cidade e devia ser por ela apreciado. Logo o plebiscito interno é menos democrático que o Consuni, que tem representantes de ex-alunos, da prefeitura e do governo do estado, logo, representantes das instituições democráticas da população que nos paga.” No entanto, na hora de eleger o reitor e os Decanos, o prof. Alcino não se lembra de chamar a população que nos paga. E será que esta população se sente representada com apenas dois ou três membros, dentre eles o prof. Erickson, diretor da Poli, que representa os ex-alunos ? Na hora que precisam de nossos votos enquanto “população” universitária nos adulam, na hora em que queremos valer nossas opiniões, acusam-nos de elitistas.
Finalmente, o missivista revela sua meta : “O que eu não aceito é que um sindicato justifique a bestialidade, a barbárie e a intimidação. Ao contrario, deveriam nos acompanhar no pedido de punição exemplar que dirijo aos meus companheiros e ao Magnifico Reitor. Que todos os responsáveis por este lamentável episódio sejam punidos! Se forem nossos alunos, servidores tecnico-administrativos em educação ou docentes, que sejam submetidos ao Código Disciplinar, obviamente cercados do direito de ampla defesa. Se forem alunos, servidores tecnico-administrativos em educação ou docentes de outras universidades que seja encaminhado oficio a elas pedindo a abertura de sindicancia lá. Se forem alienigenas ao nosso meio que sejam encaminhadas cópias da gravação da TV universitária ao Ministério Público e/ou à Policia Federal para as devidas providencias! ” Ou seja um amplo inquérito policial administrativo sobre a Reunião do Conselho Universitário do dia 18 de outubro. Ora, se os fatos foram tão graves assim, como pode-se pretender que houve normalidade na aprovação do PRE ? Ou seja, na hora de fazer calar a oposição, inquérito neles, na hora de se questionar a legalidade da deliberação, tudo normal ! Aliás é assim que o texto do Olhar Virtual encerra a cobertura da reunião: “Como a maior parte dos conselheiros votou favoravelmente à resolução do PRE/UFRJ, o prof. Aloísio declarou aprovado o documento e encerrou a sessão.” Temos, portanto, um caso de uma vítima que é cúmplice, geme no IML e faz um “grand jeté” no palco !

quinta-feira, 18 de outubro de 2007

O abismo que nos protege


O abismo que nos protege

O atual Reitor da UFRJ, quando há alguns anos atrás, foi preterido na lista tríplice, buscou, a partir da ilegitimidade de seu oponente, inviabilizar a legalidade do mandato que lhe fora usurpado por decisão do Ministro da Educação. Não conseguiu, mas saiu da reitoria ocupada nos ombros dos estudantes, ladeado por dois cordões de policiais, ali colocados por ordem judicial. Perdera definitivamente a eleição, mas tornara-se o líder inconteste da comunidade da UFRJ.
Desde o ano passado, o Reitor parece querer trilhar o caminho inverso, de ilegalidade, em ilegalidade, terminará por perder a legitimidade. O ponto de inflexão deste comportamento se dá quando sobe a rampa do Planalto e declara apoio ao candidato à reeleição. Uma violação cabal do Estatuto do Funcionalismo Público. Neste instante, deixa de ser homem de estado, e torna-se homem de governo. E, é como homem de governo, que assina o Manifesto da Universidade Nova, sem que o Conselho Universitário da UFRJ tivesse se posicionado a respeito.
Mas é a partir da promulgação do Decreto do REUNI que as atitudes resvalam do partidarismo para o atropelo das normas legais. A reunião do dia 19 de Julho do Conselho Universitário que aprovou o relatório da Comissão criada para avaliar o PDE, careceu das condições mínimas para que sua votação pudesse ser considerada válida, uma vez que o recinto do Conselho encontrava-se ocupado por ruidosos estudantes contrários ao projeto. À autoridade caberia duas atitudes: ou suspendia a reunião, ou determinava a saída dos invasores. Não fez nem uma coisa, nem outra, insistindo para que os conselheiros remanescentes votassem naquelas condições que não permitiam sequer a verificação de quorum.

Três meses foram suficientes para potencializar o erro anterior e produzir o desastre do dia de hoje, 18 de outubro, que só não se tornou uma tragédia, porque o abismo, ou melhor, o medo do abismo nos protege. Ao convocar uma reunião do Conselho Universitário para o auditório do CT, nas condições atuais, expondo os conselheiros no palco a uma platéia que vem sendo engabelada, desde maio, com metamorfoses, manobras e diversionismos, o Reitor pretendeu dramatizar a aprovação do PRE, e por esse motivo é o principal responsável pelos acontecimentos deploráveis que ali se deram. Pior, pretendeu deliberar a aprovação do PRE em meio a uma condição absurda de pancadaria, ocupação generalizada do palco e total perda de compostura. Nenhum juiz, instado a se pronunciar sobre a legalidade da deliberação, recusará o veredito de nulidade da mesma. Basta ver as muitas fotos e vídeos sobre o ocorrido.

Se o reitor não se despir do que resta de sua fantasia de líder popular, terá de realizar as próximas reuniões do CONSUNI em algum quartel nas vizinhanças da universidade, ou então, contratar mais do que os quatro seguranças que hoje subiram ao palco do CT, não se sabe exatamente para que ou a mando de quem.


quarta-feira, 17 de outubro de 2007

EXPANSÃO E REFORMA DA UFRJ:UMA PROPOSTA ALTERNATIVA PARA O DEBATE










EXPANSÃO E REFORMA DA UFRJ:
UMA PROPOSTA ALTERNATIVA PARA O DEBATE



Em consonância com a mobilização social em prol da ampliação do direito à educação superior pública, a universidade pública deve ser protagônica na ampliação do acesso, buscando, no gozo de sua autonomia, formas que assegurem um real universalismo no acesso, por meio de políticas de democratização que suplantem a falsa meritocracia classista. Também o conteúdo da universidade – no ensino, pesquisa e extensão – deve ser enfrentado e, como corolário, novas formas de auto-organização e de autogoverno devem ser buscadas para que essas transformações tenham a radicalidade necessária.


Apresentação

Após o Decreto do REUNI e o encaminhamento da Comissão instituída pelo CONSUNI para organizar o debate sobre o Plano de Desenvolvimento da Educação/ REUNI na UFRJ – que, no lugar de promover o debate, listou os critérios a serem seguidos para sua adesão – diversas unidades organizaram reuniões amplas para avaliar as referidas medidas. No campus da Praia Vermelha, a Faculdade de Educação, a Escola de Serviço Social, o Instituto de Psicologia e o Colégio de Aplicação, entre outras, realizaram assembléias e reuniões amplas com professores, estudantes e técnico-administrativos. Prevaleceu, nessas unidades, uma avaliação negativa sobre os fundamentos do REUNI e, em especial, sobre a proposta de reestruturação apresentada pela reitoria.

Por ocasião dos debates no campus, vários professores, técnicos-administrativos e estudantes da graduação e da pós-graduação de outras unidades apoiaram a proposta de realização de um seminário que discutiria alternativas ao REUNI e ao projeto da reitoria. Neste encontro, realizado em 26/9/07, os participantes deliberaram organizar grupos de trabalho que pudessem esboçar alternativas ao REUNI e ao documento da reitoria, priorizando a sistematização das propostas de expansão já elaboradas pelas unidades da Praia Vermelha, objetivando reivindicar recursos para 2008 (fora do REUNI), bem como grupos que pudessem sistematizar os seguintes temas: função social da universidade; expansão e democratização do acesso; autonomia universitária; problemas epistemológicos e epistêmicos; financiamento público e infra-estrutura.
A idéia motriz dos participantes foi que, em consonância com a mobilização social em prol da ampliação do direito à educação superior pública, a universidade pública deve ser protagônica na ampliação do acesso, buscando, no gozo de sua autonomia, formas que assegurem um real universalismo no acesso, por meio de políticas de democratização que suplantem a falsa meritocracia classista. Na compreensão dos participantes do seminário, também o conteúdo da universidade – no ensino, pesquisa e extensão – deve ser enfrentado e, como corolário, novas formas de auto-organização e de autogoverno devem ser buscadas para que essas transformações tenham a radicalidade necessária.

A proposta preliminar apresentada no presente documento, sistematizada em 15/10/07, expressa o consenso do coletivo que a elaborou. Até o presente momento, o documento não expressa institucionalmente as unidades que convocaram os dois seminários, pois não houve tempo hábil para submetê-lo às instâncias formais, mas isso não retira seu valor enquanto documento capaz de subsidiar a reforma da UFRJ e a elaboração emergencial de propostas de expansão.

O objetivo do documento não é, portanto, se constituir em um substitutivo ao REUNI a ser votado na sessão do CONSUNI de 18 de outubro. Compreendemos que a melhor alternativa seria que o CONSUNI rejeitasse o contrato de gestão imposto pelo MEC, votando contra a adesão ao REUNI, remetendo, ao mesmo tempo, as propostas contidas no chamado Módulo I para serem reexaminadas pelas unidades, visto que, como salientado, muitas unidades elaboraram suas propostas de expansão considerando os termos do REUNI/ Universidade Nova, pois esta foi a orientação da Comissão que deveria ter se limitado a organizar o debate sobre o tema. É nesse processo de reavaliação sobre as alternativas que o documento ora apresentado ao debate, pode servir como um subsídio.

O leitor observará que o documento trabalha com duas temporalidades: a primeira diz respeito ao orçamento de 2008. O coletivo da Praia Vermelha compreende que a UFRJ tem de apresentar sim uma proposta emergencial de ampliação de vagas, notadamente por meio da ampliação do ensino noturno, com novos concursos e uma robusta política de assistência estudantil, indicando ao MEC e à ANDIFES que a UFRJ quer expandir suas vagas, mas não nos marcos do REUNI/ Universidade Nova, reduzindo o tempo dos cursos de graduação e flexibilizando os currículos a ponto de torná-los referências de cursos de formação geral superficiais e de “pronta entrega”. A segunda temporalidade, mais dilatada, está comprometida com um processo radical de reforma da universidade pública, capaz de modificar, em profundidade, a natureza e o caráter da universidade pública e a sua composição social e étnica.
Em uma primeira seção, a proposta examina a nova versão do PRE-UFRJ apresentada pela reitoria, destacando que, a despeito de um bom diagnóstico do que seria uma agenda política para a universidade, ela permanece prisioneira dos marcos do REUNI. Na segunda, faz encaminhamentos para o CONSUNI assim como recomendações acadêmico-políticas; na terceira, discute a função social da universidade pública; na quarta, faz considerações sobre a autonomia universitária; na quinta, faz propostas objetivas para a ampliação e democratização do acesso; na sexta, apresenta as propostas de assistência estudantil e, finalmente, na sétima, indica a necessidade de mudanças no padrão de financiamento das IFES, de modo a garantir novos concursos e a infra-estrutura necessária para a forte expansão das matrículas das IFES.


I
Análise do PRE-UFRJ – Recomendações Acadêmico-Políticas

A nova versão do “Plano de Reestruturação e Expansão da UFRJ” apresentada pela reitoria para deliberação na sessão extraordinária do Consuni (18/10), embora tenha incorporado algumas sugestões provenientes das audiências públicas, continua, em essência, operacionalizando o Decreto nº 6.096 de 24 de abril de 2007.
A proposta preliminar de fato foi discutida em reuniões e audiências, entretanto, o método de debate não favoreceu a construção ativa de uma proposta que expressasse os anseios da UFRJ, por isso, as críticas aos termos do REUNI não foram incorporadas na nova versão. A comunidade da UFRJ se manifestou criticamente sobre o documento da reitoria, mas na hora de elaborar uma nova proposta foi relegada à condição de expectadora do processo, pois a versão que será examinada pelo CONSUNI foi fruto da decisão monocrática da reitoria.

A reitoria clama por um novo modelo acadêmico, mas poucos têm idéia do que a administração está pensando sobre o tema. As indicações sobre o modelo presentes na versão em discussão sugerem o modelo da Universidade Nova (fim dos departamentos, flexibilidade, bacharelados interdisciplinares com terminalidade breve), mas nada é explícito. Inicialmente, a idéia fundadora era a necessidade da transdiciplinaridade, mas, com os debates, a reitoria abandonou esse fundamento, mas não explicitou quais as principais idéias-força que nortearão o modelo pretendido. As medidas não fazem parte de um projeto com metas e pressupostos claramente expostos.

As “Considerações...” apresentadas pela Reitoria – itens (i) a (ix), nova versão, proposta de resolução, p. 2 – que subsidiam a proposta de adesão da UFRJ ao REUNI por meio do PRE-UFRJ, indicam que existe uma plataforma comum para a construção de um consenso ativo que expresse os anseios dos estudantes, professores e técnicos e administrativos. No entanto, o conteúdo do que é proposto como resolução para o CONSUNI objetivamente cria um fato ao propugnar que somente existe uma única via para avançar nos problemas indicados nas referidas “Considerações”: o REUNI. Com efeito, os seus pontos mais polêmicos e axiais foram mantidos, como:
· as “novas alternativas e trajetórias de formação profissional” e a busca de “novos paradigmas acadêmicos de educação superior” não explicitados (Universidade Nova?);
· a “redefinição da estrutura de organização e de administração acadêmica ...objetivando a gestão (?) do conhecimento”;
· a “redefinição do Plano Diretor de Ocupação da Ilha da Cidade Universitária e reordenamento espacial das unidades acadêmicas”, proposição que, ainda que não explicitamente apresentada, abre a possibilidade de cessão e alienação de patrimônio, como a maior parte do campus da Praia Vermelha; e
· o pressuposto de que os módulos II e III devem ser implementados, quando a quase totalidade da comunidade se posicionou contra os mesmos, atesta o quanto essas proposições seguem estruturando a proposta da reitoria. Considerando o prazo previsto (julho 08) e o método de discussão até aqui adotado, dificilmente os referidos módulos serão discutidos democraticamente.

Com efeito, o bacharelado interdisciplinar (Módulo II) e os cursos de terminalidade breve, pensados como estratégia de ampliação do acesso dos segmentos sociais mais explorados (Módulo III), requerem estudos e debates que dificilmente poderão ser levados a bom termo em prazo tão exíguo.
Outro motivo de intensa preocupação é a orientação de que o novo estatuto e regimento da UFRJ sejam elaborados fora de um processo estatuinte, que tenha como ponto de partida um congresso universitário, restringindo o debate aos conselhos superiores (IX), objetivando implementar a flexibilização curricular pretendida nos módulos II e III – o fundamento da proposta de BI e dos cursos de terminalidade breve – conforme as diretrizes do MEC para a implementação do REUNI (e aqui da Universidade Nova).
A nova versão ressignifica a função do CAp, inserindo-o como dimensão estritamente escolar e técnica, em detrimento de sua função precípua de formação de professores em conjunto com a Faculdade de Educação e demais unidades relacionadas à formação de docentes.
Mesmo em relação ao Módulo I, distintamente do afirmado, o documento preliminar que deu origem a proposta da UFRJ não foi o PDI, mas o relatório elaborado pela Comissão do CONSUNI que, lamentavelmente, induziu as unidades a aceitarem os termos do REUNI ao elaborar um formulário de adesão que teria de ser preenchido em um intervalo de tempo sumamente curto.

Finalmente, o documento parece ocultar os termos gerais do REUNI, como a relação professor-estudante de 1:18 e a taxa de conclusão de 90%. O documento tampouco menciona a ordem de grandeza dos recursos disponibilizados para o REUNI, absolutamente insuficientes, em particular pelo fato de que a maior parte do orçamento do programa será disponibilizado após o mandato do atual presidente da República. Ainda que parcialmente previsto no orçamento (2010-2011), é preciso lembrar o fato óbvio de que, no Brasil, o orçamento apenas autoriza a despesa, mas não garante a sua execução (vide os R$ 5 bilhões contingenciados do FNDCT).
Embora a nova versão preveja uma expansão muito próxima das metas exigidas pelo REUNI (4 mil novas matrículas por ano), é completamente omissa em relação ao fato concreto de que a LOA 2008 não prevê recursos para pessoal, assim como o PAC, por meio do PL 01/07 congela os gastos com pessoal (e as despesas correntes em geral) pelos próximos 10 anos.


Nesse sentido, apresentamos as seguintes recomendações acadêmico-políticas:

1. Considerando que no PRE-UFRJ, apresentado pela Reitoria para análise da Sessão Extraordinária do CONSUNI de 18/10, pontos axiais do Reuni foram mantidos e, ainda, alguns dos projetos oriundos das Unidades contidos no Módulo I, incorporaram as diretrizes do Reuni (conforme ‘Relatório da Comissão para análise do PDE’, criada pela Portaria 1345 e retificada pela Portaria 1440, cf. “Prioridades definidas pela Comissão”) - Recomendamos ao CONSUNI:
a. O voto contrário à aprovação do PRE-UFRJ nos termos da resolução apresentada pela reitoria;
b. Que os projetos contidos no Módulo I retornem para as unidades de origem para reavaliação da comunidade e das congregações;
c. A reelaboração de um novo PRE-UFRJ, fora dos marcos do Reuni, a partir de amplo debate com a comunidade universitária.
2. Recomendamos à ANDIFES que a aprovação de medidas para a expansão em 2008 seja feita apenas com base nos projetos das IFES, fora dos marcos do Reuni, ressaltando que esta entidade deve ter papel crítico e protagônico da defesa da universidade pública;
3. Manifestamos a crítica ao conceito de ‘Terminalidade Breve’, assim como ao uso instrumental da EAD, que expressam mudanças estruturais na universidade brasileira, baseadas em pressupostos muito semelhantes aos do projeto Universidade Nova, não discutidos de forma aprofundada pela comunidade universitária;
4. Manifestamo-nos contrários a intensificação do trabalho docente e dos técnicos administrativos, assim como à utilização de estudantes como substitutos precarizados ao trabalho docente, nos projetos de ‘reestruturação das IFES.
5. Apresentamos uma proposta de debate a propósito da necessária expansão e reforma da UFRJ, que deve ser entendida como uma contribuição que esperamos ser amplamente divulgada e debatida no caminho de um novo PRE-UFRJ que possa de fato expressar os anseios da comunidade universitária.

EXPANSÃO E REFORMA DA UFRJ – o debate necessário

Diante das contradições do REUNI/Universidade Nova, cabe à comunidade universitária interrogar o passado em nome do futuro, por meio da construção de alternativas. Nesse percurso consideramos que os eixos da construção de alternativas reais para as universidades públicas brasileiras devem priorizar o debate dos seguintes temas: função social da universidade; expansão e democratização do acesso; autonomia universitária; problemas epistemológicos e epistêmicos; financiamento público e a infra-estrutura.

II
FUNÇÃO SOCIAL DA UNIVERSIDADE

Não cabe analisar aqui a formação da sociedade brasileira, apenas a constatação de sua posição periférica no sistema interestatal mundial e a extrema desigualdade na distribuição do poder entre seus cidadãos: seja na forma de propriedade, de renda, de meios de difundir as idéias, de acesso aos canais políticos, de produção de conhecimento, etc. Portanto, para ser voltada para o “social”, a universidade não pode apenas referir-se a uma sociedade abstrata, mas buscar transformar essa realidade social segundo certos valores: do humanismo, da igualdade social e da difusão da cidadania para além do seu aspecto mais formal e aparente (o voto).
Restringir a função social da universidade à difusão de técnicas adequadas ao mercado de trabalho e à prestação de serviços de educação à sociedade é, na sociedade concreta, aproximá-la dos interesses imediatos do mercado, mercado este que não está requerendo sequer a formação técnica de alta qualidade, empobrecendo o horizonte da formação humana integral.
O fato de que políticas educacionais deliberadas levaram a universidade pública brasileira a ser uma instituição destinada a uma pequena parcela da juventude, cerca de 3% dos jovens entre 18 e 24 anos é, sem dúvida, inadmissível e por isso não há como pensar em uma função social democrática para a universidade sem a transformação profunda dessa realidade. A estagnação dos investimentos nas instituições públicas do ensino básico e superior e, alternativamente, a expansão vertiginosa da oferta de educação superior privada de caráter empresarial, inclusive com verbas públicas, transformaram a educação superior brasileira em uma das mais injustas do mundo. Os acertados reclamos de movimentos sociais e da juventude pela sua democratização são, portanto, motivo de alento para todos os que compreendem que o acesso a este espaço público de produção e socialização de conhecimento deve ser um direito da cidadania e um dever do Estado.

O Decreto 6096/07 que dispõe sobre o REUNI pretende praticamente dobrar o número de estudantes, mas não altera a ordem de grandeza dos recursos atuais das IFES e não prevê novos concursos para professores e técnicos e administrativos. Não menos grave, o próprio Decreto afirma que os recursos irão depender da disponibilidade orçamentária do MEC! O próprio documento que explicita o REUNI é claro quanto à ordem de grandeza dos recursos: “O total de investimentos projetados para o período de 2008 a 2011 é da ordem de 2 bilhões de reais. O valor acrescido ao orçamento de custeio e pessoal de cada universidade aumentará gradativamente, no período de cinco anos, até atingir, ao final, o montante correspondente a 20% do previsto para 2007”[1], excluindo as verbas de aposentadorias.
Portanto, expandir o acesso é essencial, contudo essa expansão só adquire significado social se for capaz de incluir as camadas mais desfavorecidas e acabar com a exclusão que se dá a partir da diferenciação entre os sem diploma e os com diploma. Se a estas pessoas não são dadas as ferramentas para modificar a realidade opressora na qual vivemos, então não haverá função realmente pública, apenas se ampliará a proporção de incluídos em relação aos excluídos.
Para ser de fato pública, a universidade deve tornar público um conhecimento que por sua vez torne possível alterar as desigualdades na distribuição do poder em todas as dimensões já citadas. Ou seja, deve-se orientar o saber com o objetivo de transformar a sociedade. O PRE-UFRJ/REUNI menciona a necessidade de novas arquiteturas curriculares, mas não explicita que conhecimentos devem ser produzidos, nem como os produzir, ou para que os produzir. Ou seja, a lógica utilitarista e pragmática vigente não é sequer mencionada, assim como os nichos destinados aos negócios que corroém o caráter público da universidade.
Quando a socialização dos saberes é pensada a partir da criação de ciclos de graduação com terminalidade breve, organizados por meio de estratégias semipresenciais, de flexibilização curricular desenvolvida a partir de ciclos básicos comuns, do abandono da profissionalização e da adesão a modelos estrangeiros estabelecidos, as mudanças propostas não se alinham à perspectiva de transformação, profunda e necessária, da sociedade brasileira, mas à adequação aos interesses do mercado.

A nova visão de formação profissional, que vem sendo difundida por meio de documentos como os do FORGRAD (Fórum de Pró-reitores de graduação), defende a ruptura com o modelo fordista, voltado para a especificidade e para a delimitação de competências e habilidades do profissional formado pela universidade. Argumenta-se que hoje o estudante deve ter ampla competência e dominar muitas habilidades, como por exemplo a informática, o conhecimento de gestão, o comando de operações, etc. O que não é dito, porém, é que essa concepção prevê apenas a substituição de um modelo por outro, qual seja, o toyotista, atualmente adotado pelas grandes empresas capitalistas. O modelo de fundo, contudo, é o da escolarização rápida, superficial, pois o pressuposto é que como o mercado é desregulamentado e flexível, uma formação minimalista basta para a grande massa de jovens, o público que fará os bacharelados interdisciplinares de terminalidade breve.

Em vista disso, reorientar a produção do saber e flexibilizar os currículos são medidas que devem ser balizadas por outra filosofia: a de buscar desenvolver, em cada unidade acadêmica, formas de utilizar o conhecimento para alterar as relações opressoras de nossa sociedade. Essa ação transformadora pode ser perseguida de três formas: i) diretamente através da aplicação do conhecimento na realidade social histórica e geograficamente determinadas, ii) produzindo conhecimento comprometido com a solução dos grandes problemas nacionais e iii) através do processo de formação de todos os universitários acerca da realidade histórica e geográfica da qual fazem parte, inserindo-os no tecido social que financia seus estudos e do qual provêm, visando às mudanças segundo os valores humanistas já mencionados. Cada uma dessas formas encontrará suas possibilidades e relevância dependendo da área do conhecimento na qual se insere.

Cabe destacar também que a imersão da universidade na realidade social talvez seja a melhor forma de orientar o conhecimento para um determinado fim sem nenhum dirigismo que estaria necessariamente fadado ao fracasso e à censura da pesquisa.
O diálogo de saberes entre a universidade e os movimentos sociais e as políticas públicas não pode ser episódico, pontual e dependente da iniciativa isolada de grupos dentro e fora da universidade, mas, antes, por meio de atividades sistemáticas, organicamente estruturadas na vida da universidade, por meio da extensão universitária. Todas as atividades de extensão precisam compor o plano de trabalho dos docentes, técnico-administrativos e estudantes.

Por último, cabe salientar que a universidade realmente pública tem de produzir um conhecimento que, principalmente nas ciências humanas, poderá conter um conteúdo propositivo diverso das proposições advindas das universidades dos países centrais, muitas delas comprometidas com o capitalismo acadêmico que as torna instituições pouco autônomas frente aos interesses de corporações. Assim, a produção nas humanidades tem uma dupla importância: não só porque situa o estudante histórica e geograficamente, como define a própria história e geografia a partir de sua pesquisa. A produção e difusão desse saber são essenciais para formar o cidadão politizado.

Assim, a socialização da Universidade não se restringe, apenas, à universalização do acesso, mas pressupõe a inserção desta universidade em um determinado contexto social. O argumento de que essa não é tarefa da universidade e sim da sociedade, do sistema educacional como um todo, tem uma razão parcial. Mas é justamente a nossa especificidade histórica que nos permite afirmar que uma vez que essa formação não ocorreu, a universidade, como um centro de criação e difusão do conhecimento, deve assumir para si também esse papel.

Cabe lembrar que o objetivo central de toda a luta política em prol da educação pública é a estreita articulação da educação superior com a educação básica, o oposto do que é pretendido pelo decreto do Reuni, dirigido, na prática, para a reestruturação e a expansão das universidades.

Em suma, a produção de conhecimento novo e sua socialização, com base em outras perspectivas epistemológicas e epistêmicas que não as eurocêntricas, objetivam uma universidade cuja função social é contribuir para forjar o público frente aos privilégios do privado-mercantil, por meio da radical desmercantilização do conhecimento, compreendido aqui como um direito humano fundamental.

III
AUTONOMIA UNIVERSITÁRIA


O desenvolvimento contemporâneo das forças produtivas, criou as condições que possibilitaram a mercantilização das atividades culturais, processo este que se expressa de forma mistificada no debate conhecido como cultura pós-moderna. Com efeito, uma das vertentes deste debate tem como ponto de partida o relatório do filósofo francês Lyotard[2] para o Conselho das Universidades do governo de Quebec, no Canadá, publicado no ano de 1979. Aquilo que no projeto "Universidade Necessária" é designado como transdisciplinariedade (e na Universidade Nova está sendo chamado de interdisciplinaridade), para além do debate epistemológico, é na verdade uma tentativa de embalar os cursos de curta duração, tidos como a universidade necessária para o capital em países capitalistas dependentes, em um envólucro mais palatável para os professores e estudantes, aqui ressignificados, respectivamente, como empreendedores e consumidores.

A base material que possibilita o surgimento da "Universidade de serviços" é a chamada sociedade do conhecimento que concebe a universidade como empresa prestadora de serviços através de contratos de gestão e de parcerias público-privadas.

Esse processo de subordinação da universidade à sociedade do conhecimento colide frontalmente com o que pode ser denominado como "Universidade Latino-americana", a universidade surgida com o movimento reformista de Córdoba no ano de 1918, pautada pelos princípios da autonomia e do governo compartilhado. Esse ideário também foi assumido, a partir da década de 1960, pela União Nacional de Estudantes (UNE) através da greve conhecida como a “greve do terço” que lutava pelo governo compartilhado da universidade, movimento abortado pela ditadura de 1964 e particularmente pelo giro reacionário do emblemático ano de 1968. Naquele movimento reformista estavam unidas a Reforma Universitária junto com a Reforma Social, indicando claramente que as demandas por autonomia e co-governo não eram propostas de isolamento ou de cercar a universidade numa "torre de marfim". A articulação da Universidade com a sociedade era veiculada pela prática da extensão universitária que fazia parte do núcleo das propostas do movimento reformista.

Nossa proposta reivindica a melhor tradição reformista latino-americana propondo mudanças na universidade numa perspectiva de avanço da causa democrática em benefício da maioria da população. Para isto é necessário partir de uma definição da autonomia universitária, não pelo critério dos contratos de gestão, mas pelo direito e pelo poder de definir suas normas de formação, docência, pesquisa e extensão. Neste sentido, a autonomia precisa ser entendida em três sentidos principais: a) como autonomia institucional ou de política acadêmica; b) como autonomia intelectual; e c) como autonomia de gestão financeira. Com esta compreensão, é que deve ser entendido o artigo 207 da norma constitucional que consagra a autonomia universitária de um modo pleno, sem necessidade de lei complementar:

“As universidades gozam de autonomia didático-científica, administrativa e de gestão financeira e patrimonial, e obedecerão ao princípio de indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão".
Entendemos que a autonomia universitária é indissociável da democracia interna das IES, tendo sido, ao longo da história do Movimento Docente, uma de suas principais bandeiras de luta. Da conceituação de autonomia universitária depende a definição do financiamento, da carreira docente, da política de pessoal, do regime jurídico (reconhecendo-a como `ente jurídico peculiar`, capaz de autonormação e auto-gestão), do processo de escolha de dirigentes, da avaliação, entre outros. O autogoverno com ampla participação estudantil e dos funcionários técnico-administrativos (e de setores da sociedade) precisará ser aperfeiçoado para poder realizar uma gestão democrática, sem menosprezar a eficácia e eficiência administrativa.

Para sua plena efetivação, a autonomia universitária requer não somente que a universidade estabeleça seus próprios princípios de ação como também determine procedimentos de controle da mesma. Se observarmos o quadro atual, veremos que as universidades federais, em particular, têm sua “autonomia” comprometida, porquanto o MEC, na trilha dos organismos financeiros internacionais, impõe às mesmas diretrizes que devem ser seguidas, bem como estabelece padrões de controle heteronômicos das atividades acadêmicas.

Com relação especificamente à autonomia de gestão “financeira”, observam-se na UFRJ casos em que alguns setores são, de fato, ‘soberanos’. Seus orçamentos respectivos não são considerados no orçamento geral da universidade (somente são contabilizados os 5% que repassam às fundações). Como a UFRJ pode autonomamente estabelecer políticas de recursos humanos, se os programas de algumas unidades estabelecem quadros remuneratórios diferenciados? Trata-se de um processo de privatização ‘endógena’ da universidade pública. Desse modo, as fundações (que são de natureza privada) também afrontam a autonomia da universidade pública.

Do ponto de vista interno, a “autonomia” pode estender-se aos diferentes Centros e Unidades da universidade, através do fortalecimento dos colegiados e demais espaços públicos, concebidos aqui como esferas que praticam o autogoverno compartilhado da universidade.

Finalmente, mas não menos importante, a autonomia se expressa pela prerrogativa da autonormação. A Constituição assegurou às universidades a faculdade de elaborar as suas próprias leis, por meio do Estatuto, referenciadas exclusivamente nos termos da Carta Magna. Nenhuma lei infra-constitucional que regulamente a vida universitária retirando o amplo grau de autonomia assegurado pela Carta pode tolher a escrita da lei interna dos entes universitários. Por isso, compreendemos que o processo de elaboração do Estatuto é um momento constituinte para a vida acadêmica. Objetivamente, o Estatuto da UFRJ está incrustrado de heteronomias e precisa ser substituído por um novo conjunto de leis internas. A realização de um amplo e democrático congresso interno é a melhor forma de iniciarmos um processo estatuinte que resulte em uma universidade reformada, autônoma frente aos governos, credos religiosos, aos interesses do mercado, concebidas como espaços públicos de produção e socialização de conhecimentos comprometidos com os problemas nacionais.

IV
AMPLIAÇÃO E DEMOCRATIZAÇÃO DO ACESSO


A democratização do acesso ao ensino superior público é reivindicada há décadas pelos movimentos sociais. Todavia, apenas 3% dos jovens entre 18 e 24 anos estudam em universidades públicas hoje. As estatísticas confirmam a afirmativa encontrada em documento do Andes-SN[3] no sentido de que o ingresso, e o seguimento aos estudos, em instituições públicas e gratuitas de educação superior não estão ao alcance da esmagadora maioria da sociedade brasileira; note-se, uma sociedade capitalista dependente orientada por políticas macroeconômicas que perpetuam e aprofundam desigualdades existentes.

Observa-se que a desigualdade mencionada é justamente um dos fatores que contribui para que grande parte da população – em especial a população de baixa renda – não tenha acesso ao ensino superior. Os impedimentos apresentam-se desde a criança que não pode dar seguimento aos estudos na educação básica, pois necessita trabalhar para ajudar na economia doméstica, até o adolescente que ao concluir o ensino médio não obtêm uma vaga no afunilado sistema público superior, assim como não dispõe de dinheiro para assegurar uma vaga no crescente sistema privado de educação superior.

Frente a tal quadro, não há de ser por meio de políticas neoliberais – exatamente as que se encontram nas origens de tal conjuntura – que poderemos alcançar transformações que venham de encontro aos anseios dos movimentos sociais. Pelo contrário, tais políticas só fazem ampliar a exclusão a que determinados segmentos da sociedade estão sujeitos. Exclusão que não lhes assegura o direito básico à educação pública de qualidade.

Medidas urgentes na direção de se conseguir a universalização do acesso ao nível de ensino superior são necessárias, como afirma de forma contundente o PNE – Sociedade Brasileira. A democratização almejada não deve, contudo, apoiar-se em um universalismo falacioso, ignorante das desigualdades que atravessam e dão contornos específicos à constituição das classes sociais no Brasil. O pertencimento à determinada classe social e a determinadas etnias condicionam os direitos a que os cidadãos terão acesso, tornando imprescindível a elaboração de políticas afirmativas no intuito de garantir condições para que as políticas universais não sejam uma mera carta de boas intenções nunca realizável. O universalismo em uma sociedade de classes requer que os explorados e expropriados possam ter acesso real ao que de melhor existe em termos de políticas públicas. E é nesse sentido que pensamos as políticas de democratização do acesso das classes populares às universidades públicas.

Políticas de democratização do acesso e políticas para a Educação Básica

No PNE da Sociedade Brasileira (1997), elaborado coletivamente por setores da sociedade civil comprometidos com a educação pública, compreendendo inúmeras instituições e entidades representativas por meio de debates sistemáticos em seminários locais, regionais e nacionais, a democratização do acesso ao nível superior público já estava pautada. Objetivava-se a inserção de 40% da população entre 18 e 24 anos, inclusive os alunos com necessidades especiais, em instituições de ensino superior, no intervalo de dez anos.

O plano apresentou como diretrizes: a expansão da rede pública, atentando para as desigualdades regionais – e sociais – do país no sentido de diminuí-las, assegurando-se recursos para o pleno aproveitamento da capacidade física instalada para o ensino, pesquisa e extensão; a garantia de condições materiais para o desenvolvimento acadêmico do estudante universitário, tais como alimentação, transporte, moradia e disponibilidade de material de estudo aos que necessitassem.

A realização da meta proposta, por meio das diretrizes apresentadas, não poderia desconsiderar, assim como está no documento do Andes-SN, a oferta de educação básica de qualidade, observando-se a prioridade desta em locais de maior exclusão estrutural. Essas escolas públicas, em vista das demandas a que iriam de encontro, deveriam contar com apoio federal para que fossem asseguradas as condições necessárias a seu pleno funcionamento. Universidades públicas estariam sistematicamente acompanhando e dando suporte às mesmas. O referido documento defende, ainda, que essas universidades, no gozo de sua autonomia, deveriam formular estratégias para que descendentes dos povos originários, comunidades quilombolas e movimentos sociais do campo pudessem ter assegurado seu acesso. Dessa forma, esses segmentos sociais contariam com imprescindível fortalecimento às iniciativas de ocupação democrática do território. Observa, também, a extinção progressiva dos processos seletivos por meio do vestibular e a implementação de um sistema de avaliações realizadas pelas instituições de ensino superior em articulação com as redes de ensino básico.

É importante acrescentar que, ainda que teoricamente o ensino fundamental público (crianças de 7 a 14 anos) tenha sido universalizado, na prática as escolas não têm conseguido assegurar um padrão de qualidade que permita aos estudantes uma escolaridade média com 8 anos de ensino. No Brasil, há 170 mil escolas públicas – e apenas 47% têm quatro horas (ou mais) de aulas por dia. O acesso formal por si só não elimina as dificuldades para o aprendizado. Também no ensino médio o quadro não é diferente. Por isso, toda e qualquer política que caminhe na direção de um futuro acesso universal ao ensino superior público, não deve prescindir de uma política de valorização do ensino básico.

No PRE-UFRJ apresentado pela Reitoria para deliberação do Consuni em 18/10/07, propõe-se a retomada da “discussão, com vistas a uma deliberação sobre o assunto em prazo não superior a oito meses, do Programa Piloto de Acesso aos Cursos de Graduação da UFRJ para a Rede pública Estadual, elaborado pela PR1, apresentado nos Centros, discutido no CEG em 26 de outubro de 2005 e encaminhado às unidades para consulta”. É preciso ressaltar que o programa proposto pela PR1, na época, estava atrelado ao programa governamental “Sucesso Escolar”, onde apenas as escolas que haviam aderido a este programa estariam aptas a participar, o que gerou grande polêmica no CEG.

Cabe ainda destacar que, conforme documento ‘Anexo V’ do “Relatório da Comissão para análise do PDE” criada pela Portaria 1345 (cf. “Dados da Graduação”) a UFRJ oferece hoje 6.618 vagas de graduação e, dentre estas, apenas 684 são destinadas exclusivamente aos cursos noturnos (Direito, Bacharelado em Educação Física, Dança, História, Pedagogia, serviço Social e Licenciaturas em Física, Geografia, Matemática, Química e Ciências Biológicas), além de cerca de mais 200 vagas compartilhadas entre os turnos diurno e noturno. Tais dados demonstram que a UFRJ carece, ainda, de uma expansão significativa dos seus cursos noturnos.

Assim, na direção da universalização do acesso, como proposta alternativa ao PRE-UFRJ, indicamos:

3.1.1) Construção de alternativas ao processo seletivo do vestibular, considerando, para isso, as metas de crescimento da oferta da educação superior pública e gratuita. A meta deve ser a extinção progressiva do vestibular por meio de avaliações realizadas pelas instituições de ensino superior em articulação com as redes de ensino básico a fim de que seja garantido acesso diferenciado aos estudantes provenientes das escolas da rede conforme definição dos colegiados competentes;

3.1.2) Como parte desta estratégia, a UFRJ deve firmar convênio com escolas de ensino básico da rede pública, preferencialmente em locais de grande exclusão social. Estas escolas devem ser permanentemente acompanhadas por grupo de professores, estudantes e técnicos e administrativos da UFRJ que devem desenvolver obrigatoriamente programas de suporte pedagógico sistemático a essas escolas, por exemplo por meio de cursos de extensão ou de vinculação à formação de professores, articulando as unidades de origem, FE e CAp;

3.1.3) Na busca de estratégias para assegurar acesso a descendentes dos povos originários, às comunidades quilombolas e a movimentos sociais do campo, constituir grupo de trabalho composto por professores, estudantes e funcionários técnicos e administrativos dos diferentes centros da UFRJ, para elaborar propostas de políticas afirmativas de inclusão, por exemplo cursos específicos de graduação para esses setores a exemplo do que já ocorre em outras universidades públicas no país;

3.1.4) Ampliação dos cursos noturnos na UFRJ.

V
ASSISTÊNCIA ESTUDANTIL


As orientações para a assistência estudantil partem do diagnóstico e de proposições sistematizadas em documento da PR-1: Política de Assistência ao Estudante, compreendendo as seguintes prioridades:

1. Política de Acolhimento e instalação dos alunos de graduação e pós-graduação - deverá envolver as unidades com incumbência de promover uma atividade semestral para alunos estrangeiros e residentes fora do estado, que abordem questões legais, culturais e sociais. As informações sobre redes de serviços de apoio deverão estar atualizadas e ser divulgadas semestralmente.

2. Cursos gratuitos de línguas para os universitários, incluindo curso de português para estrangeiros. – Os estudantes das categorias C, D e E são os que têm menor domínio da língua estrangeira, apenas 14,7% apresentam um bom domínio da língua inglesa (FONAPRACE, 2006). Sugerimos ampla divulgação dos referidos cursos junto as unidades a serem informadas nas atividades desenvolvidas junto aos alunos estrangeiros.

3. Política de Assistência à saúde de alunos de graduação e pós-graduação – Segundo os dados da (FONAPRACE, 2003/04) 37% dos jovens universitários da classe C, D e E necessitam de assistência da saúde pública. Ademais, “ 36,95% dos estudantes das IFES apresentam necessidades significativas ou crise emocional durante o último ano do curso e 39,5% foram acometidos por dificuldades emocionais no início do curso” (FONAPRACE, 2003/04). Propomos a criação de uma política de atendimento envolvendo o Hospital Universitário Clementino Fraga Filho, Maternidade Escola da UFRJ/ Hospital Moncorvo Filho/Instituto de Puericultura Matargão Gesteira/Instituto de Psiquiatria/Instituto de Neurologia/ Instituto de Psicologia/ Divisão de Saúde do Trabalhador. Neste sentido a DVST deve ser a porta de acesso ao estudante que referenciará as demais unidades de saúde da UFRJ à assistência especializada necessária.

4. Comissão de Acompanhamento Acadêmico – Identificar o processo de implementação das COAAs nas diversas unidades de ensino da UFRJ e estimular a criação onde não exista, destacando a importância do trabalho das COAAS e recuperando a figura do professor orientador de turmas.

5. Alojamento – A UFRJ possui 43.187 alunos matriculados em seus cursos de graduação e pós-graduação strito sensu, contabilizando os alunos estrangeiros, para os quais oferece, apenas, 504 vagas no alojamento universitário. Segundo dados de uma pesquisa desenvolvida pelo Fórum Nacional dos Pró-Reitores as universidades federais brasileiras, as unidades públicas de ensino superior devem ofertar 30,5% (FONAPRACE, 2003/04) de vagas em alojamento aos estudantes que apresentam necessidade de moradia. No caso da UFRJ o quantitativo seria de 13.172 alojados, existe, pois, um déficit quantitativo de 12.668 vagas para alojamento na UFRJ.

6. Evasão e Vagas Ociosas – Identificar os motivos da evasão e sugerir medidas pra a s
uperação da evasão escolar na UFRJ.

7. Restaurante Universitário – 24,7 % (FONAPRACE, 2003/04) de estudantes da classe C,D e E das universidades públicas requerem os serviços do Restaurante Universitário a preços subsidiados para suprirem sua necessidade básica de alimentação e, poderem viver a dinâmica acadêmica, “contribuindo para seu melhor desempenho e formação integral” (FONAPRACE, 2006). No caso específico da UFRJ, significa criar 10.667 refeições diárias.

8. Bolsas – Nas Unidades Públicas de Ensino Superior 35,4% (FONAPRACE, 2003/04) dos estudantes das clasees C, D, e E exercem atividades não acadêmicas remuneradas para poderem cursar a universidade e/ou contribuírem com a renda familiar. Tendo em vista garantir a qualidade do desempenho discente a UFRJ, deve oferecer bolsas equivalentes a demanda por recursos econômicos. Neste sentido, deve-se aumentar o número de bolsas (auxílio, apoio, monitoria, iniciação artística e cultural, Laboratório de Informática de Graduação, Programa de Educação Tutorial, Iniciação Científica e Extensão)da UFRJ de 5.028 para 10.260.

A ampliação e distribuição do número de bolsas existentes na UFRJ considerando os seguintes critérios:
· priorizar as Unidades que apresentam maior número de alunos sem bolsa;
· considerar as Unidades com maior número de baixa renda;
· oferecer maior número de bolsas às Unidades que não tenham sido contempladas com bolsas oriundas dos Projetos financiados por editais em áreas específicas.
· No caso de empate na seleção de bolsistas priorizar os alunos baixa renda.

9. Acessibilidade – Investir no combate às barreiras atitudinais[4] e físicas[5], em todas as instâncias da UFRJ a começar pelo Vestibular.

10. Implementar um posto avançado da DAE no Campus da Praia Vermelha, em articulação com a ESS/UFRJ.

11. Transporte – A maioria dos estudantes das IFES (59,9% - FONAPRACE, 2003/04) utiliza transporte coletivo para deslocamento até a universidade. Destacamos a necessidade de promover “políticas articuladas com órgãos responsáveis pelo transporte urbano a fim de melhorar os índices de freqüência por intermédio da redução do gasto com transporte” (FONAPRACE, 2006), uma vez que boa parte dos recursos dos estudantes são gastos de transporte. Sugerimos a adoção do Tíquete Transporte UFRJ, para alunos incluídos no Programa de Assistência Estudantil. A UFRJ, pode viabilizar o recurso por intermédio de uma Política de Acesso Gratuito ao Transporte Urbano junto ao Governo do Estado e as Empresas de Transporte .

12. Acesso a Biblioteca e Laboratórios de Informática - Os dados da (FONAPRACE, 2006) revelam que 65,4% dos estudantes utilizam as bibliotecas para consultas acadêmicas. O potencial a ser explorado pelas Bibliotecas Universitárias é dificultado mediante o limite de horário de atendimento e a viabilização de novas tecnologias de acesso a informação. Existe ainda um déficit na área de informática de 56,1% de estudantes ainda sem acesso, diretamente relacionados à posse do equipamento e neste sentido cabe à Universidade ampliar a políticas de inclusão digital junto aos estudantes das categorias C, D e E, uma vez que 43,1% raramente utiliza a Internet e 10,1% nunca utilizou (FONAPRACE, 2003/04).

13. Acesso a Cultura, esporte e Lazer – “ampliação dos programas culturais, esportivos e de lazer, promovidos pelas IFES para a comunidade interna/esterna, estimulando a participação dos estudantes nesses programas”. (FONAPRACE, 2006)
As medidas aqui elencadas são compreendidas como estratégias para que o acesso e a permanência dos estudantes sejam materialmente garantidas como um dever do Estado. Todas essas orientações compõem um plano de ação universalista que assegure a todos a plena assistencia estudantil. As prioridades aqui indicadas objetivam, por conseguinte, a generalização desse direito fundamental dos estudantes.

VI
ORIENTAÇÕES GERAIS


Considerando (que):
· A universidade pública deve fazer parte da vida de toda metrópole do Rio de Janeiro e de seu interior, atendendo amplamente e indistintamente toda a comunidade que vive nas mais variadas regiões, independentemente de suas características pessoais, humanas ou sociais, reforçando o sentido amplo de seu caráter público.

· A necessidade de se romper com a lógica patrimonialista da distribuição espacial dos cursos de graduação, pós-graduação e extensão, bem como dos laboratórios e grupos de pesquisa, gabinetes de professores e espaços dedicados a administração e bibliotecas em toda a UFRJ;

· A necessidade de espaços de convivência e um ordenamento espacial que facilite a interação entre estudantes, professores e técnicos-administrativos da UFRJ;

· A importância da interação de saberes na perspectiva da totalidade na formulação e difusão do conhecimento no sistema universitário público brasileiro;

· A necessidade de preservar o patrimônio histórico nacional, especialmente aquele de responsabilidade da UFRJ;

Propomos aqui as seguintes tarefas imediatas:

· Promover amplo debate entre as unidades para a identificação de campos de diálogos interdisciplinares.
· A partir da discussão coletiva, cada unidade formular, de acordo com seus conhecimentos específicos, currículos que abram espaço para os diálogos e interações curriculares.
· Formular propostas de cursos de graduação que permitam a articulação de unidades afins que possam dividir as responsabilidades técnicas, acadêmicas e administrativas sobre os cursos. Tais cursos devem respeitar a duração e os padrões de excelência identificados coletivamente como adequados para a universidade pública e para a UFRJ.
· Discutir a possibilidade de coordenação conjunta dos cursos já existentes cuja responsabilidade acadêmica já esteja estabelecida.
· Respeitar e estimular iniciativas de integração acadêmica entre unidades por meio de criação e manutenção de laboratórios de pesquisa, seminários e atividades de extensão.
· Ampliar o número de vagas professores e técnicos-administrativos por meio de concurso público, objetivando manter a dedicação exclusiva como uma condição para a garantia da indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão.

Atualmente as 52 universidades federais (e mais as novas universidades que estão em processo de implementação) possuem, em conjunto, um orçamento próximo do dobro do orçamento das três universidade paulistas. A questão do financiamento, obviamente, é uma condição necessária para que a ampliação das vagas das universidades federais não repita a trágica história da educação básica pública: quando o sistema foi massificado, não houve acréscimos correspondentes de recursos, criando um sistema pobre para os pobres. Essa é a essência do REUNI/ Universidade Nova.

O orçamento previsto sequer arranha o problema do financiamento. Para 2008 a LOA prevê apenas R$ 480 milhões, cerca de R$ 9 milhões por instituição. Apenas para efeito de comparação, a dívida da UFRJ com fornecedores ultrapassa R% 52 milhões! Não é casual que o orçamento de 2008 impede a contratação de professores e técnico-administrativos. O custo-aluno/ano previsto no REUNI é de R$ 5 mil. Em 2003, conforme o TCU o custo estimado foi de R$ 9,7 mil. Está evidente, também, que o REUNI pretende explorar as possibilidades do banco de professores-equivalentes para ampliar a contratação de professores em tempo parcial. O custo-docente estimado no referido programa é de R$ 4 mil, o que permite antever uma universidade com docentes de 20h e 40h sem D.E, professores adequados ao modelo do “escolão”. Não menos significativo, 56% do orçamento do REUNI será liberado apenas no futuro governo federal!

A UFRJ, em conjunto com as demais IFES, deve apresentar a sua política autônoma de ampliação, elaborando uma planilha clara dos recursos necessários para uma expansão com elevado rigor, garantindo indissociabilidade, remuneração digna aos seus servidores, assistência estudantil universal, recuperação da infra-estrutura e aporte de verbas para pesquisas que não estejam prisioneiras dos editais heteronômicos.

Esses objetivos exigirão forte protagonismo de nossa comunidade. Por isso, é crucial que a construção do processo de reforma seja ao mesmo tempo um movimento que unifique todos os membros da comunidade comprometidos com a causa da educação pública. Esse é o objetivo maior dessa proposta preliminar. Os milhões de estudantes que reivindicam a universidade pública esperam essa atitude altiva da comunidade universitária. Não temos o direito de disperdiçar essa oportunidade de reformar, no sentido do público, as nossas universidades!

ASSINAM ESTE DOCUMENTO:

Agnaldo Fernandes (Técnico-administrativo, Decania do CCJE, membro do Consuni)
Albana Lúcia Brito de Azevedo (Técnico-administrativo, Escola de Comunicação)
Alessandra Lopes (discente – Faculdade de Educação)
Gabriel marques (discente, Faculdade de Educação)
Isadora Pereira (discente - Escola de Serviço Social)
Ivy Ana de Carvalho (discente - Escola de Serviço Social)
José Carlos Pereira (Técnico-administrativo, Decania do CT)
Julia Aparecida S. de Paula (discente - Escola de Serviço Social)
Júlia e Sá S. Campos (discente - Escola de Serviço Social)
Leonardo Morgan (Técnico-administrativo – Instituto de Psicologia)
Morena Marques (discente – Escola de Serviço Social)
Prof. Carlos Bessa (Faculdade de Ciências Contábeis)
Prof. Celina Maria de Souza Costa (Diretora do Colégio de Aplicação)
Prof. Gabriela lema Icasuriaga (Escola de serviço Social)
Prof. Jailson A. Santos (Faculdade de Educação)
Prof. Luis Acosta (Escola de Serviço Social)
Prof. Marcos Jardim (Diretor do Instituto de Psicologia)
Prof. Maria Cristina Miranda da Silva (Colégio de Aplicação)
Prof. Maria Magdala Vasconcelos de Araújo (Diretora da Escola de Serviço Social)
Prof. Maria Malta (Faculdade de Economia)
Prof. Mariléa Franco Marinho Inoue (Escola de Serviço Social)
Prof. Mavi Pacheco (Escola de Serviço Social)
Prof. Renato Oliveira (Diretor da Faculdade de Educação)
Prof. Roberto Leher (Faculdade de Educação)
Prof. Sandra Martins de Souza (Colégio de Aplicação)
Prof. Sara Granemann (Escola de Serviço Social)

[1] Documento Elaborado pelo Grupo Assessor nomeado pela Portaria nº 552 SESu/MEC, de 25 de junho de 2007, em complemento ao art. 1º §2º do Decreto Presidencial nº 6.096, de 24 de abril de 2007.
[2] Jean-François Lyotard. "A condição pós-moderna". 6a. edição. Rio de Janeiro: José Olympio. 2000.
[3] “Agenda para a Educação Superior: uma proposta do ANDES-SN para o Brasil de hoje”. Brasília, 2005.
[4] As barreiras atitudinais são aquelas que se referencem aos impedimentos oriundos de preconceitos que impedem o exercício da cidadania no uso amplo do ambiente e serviços oferecidos pela UFRJ.
[5] Se referem aos impedimentos de circulação e uso de espaços ou mobiliários coletivos na UFRJ.

segunda-feira, 8 de outubro de 2007

Mitos do (sub)financiamento educacional, o Decreto REUNI e o PRE-UFRJ

*Leandro Nogueira

Na segunda quinzena do último mês de setembro, passou quase desapercebida por parte da grande imprensa brasileira, a divulgação de um importante relatório internacional sobre a questão educacional, o Education at a Glance 2007, algo como Educação em um Rápido Olhar, elaborado pela OCDE, organismo multilateral que congrega cerca de trinta países, e cuja principal missão consiste no aprofundamento da democracia e na formulação de políticas públicas que se prestem à cooperação e ao desenvolvimento econômico das nações que o integram.

O Brasil não faz parte da OCDE, mas por ser considerado um importante parceiro econômico, teve também os dados do seu sistema educacional incluídos no referido relatório.

Lamentavelmente porém, a partir da análise dos números brasileiros assinalados no citado relatório, os quais não foram rebatidos ou sequer debatidos pelas nossas autoridades políticas, desponta a inevitável interpretação de que os investimentos em educação no Brasil encontram-se muito aquém do necessário, quando cotejados com a média dos países da OCDE, além de claramente insuficientes para o enfrentamento de nossas históricas demandas no setor.

Na página 194 do relatório de 451 laudas, disponibilizado gratuitamente em, www.oecd.org/document/30/0,3343,en_2649_201185_39251550_1_1_1_1,00.html, temos a informação de que no período 1994~2005, o Brasil investiu apenas a média de 3,9% do seu PIB em educação, somando-se os aportes públicos e privados para todo o seu siatema de ensino, do nível fundamental à universidade, contra a média de 6,2% do PIB, contabilizada para a mesma finalidade entre os países da OCDE.

Tem início com essa informação, a queda do primeiro mito repetido ad nauseam nas parolagens dos “especialistas” que se arvoram em autoridades acerca do financiamento educacional: o de que o Brasil investe em educação, um percentual do seu PIB proporcionalmente igual ao investido pelos países desenvolvidos.

Segundo o Education at a Glance, Coréia do Sul, Dinamarca, Estados Unidos e mesmo a pequena Islândia, investem mais de 7% de seus PIBs em educação. De acordo com o mesmo relatório, Nova Zelândia e Suécia investem mais de 6,5% de seus PIBs, em prol da mesma finalidade (pp. 194-197).

Mas a dança dos números percentuais relativos aos PIBs nacionais, não é suficiente para que seja apreendida a totalidade do infortúnio político, que decreta a escassez dos recursos destinados ao financiamento do sistema educacional brasileiro.

Ao cotejarmos os números entre o Brasil e a França, por exemplo, verificamos que no período compreendido pelo relatório da OCDE, o país europeu investiu cerca de 6% do seu PIB em educação. Ocorre entretanto, que em 2004, apenas para citar um dos anos analisados, a França contabilizava um PIB superior a 2 trilhôes de dólares, para uma população com pouco mais de 60 milhões de habitantes. No mesmo ano, o Brasil sequer investiu 4% do seu PIB, então inferior a 600 bilhões de doláres, para uma população que já contabilizava mais de 180 milhôes de habitantes.

Cai também dessa forma outro mito, nos últimos anos bastante recorrente, de que os investimentos em educação no Brasil são elevados, porém, muito mal empregados. A partir dessa falaciosa premissa, peruadas dos especialistas de aluguel têm vaticinado a necessidade dos chamados “choques de gestão”, que visariam, segundo eles, a indefectível “racionalização dos recursos” no setor da educação.

Sabemos entretanto, que os tais choques de gestão não vão coibir a corrupção política e endêmica que também assola o sistema educacional, e é responsável entre outros efeitos deletérios, pela transferência de recursos públicos para incontáveis ONGs, para o famélico PROUNI e pela espúria ingerência de deputados e vereadores, que se verifica cotidianamente sobre a administração escolar pública em todo o país.

Com efeito, a pretensa racionalização dos choques de gestão, visa apenas a intensificação radical do trabalho docente e dos demais trabalhadores educacionais, no contexto da inaceitável escassez dos recursos orçamentários necessários ao atendimento do aluno.

Por último, mas não menos importante, o relatório da OCDE nos informa também, que no ensino superior o Brasil investe apenas 0,7% do seu PIB. Nesse âmbito da educação, vale mencionar, os Estados Unidos destinam 2,9% do PIB no ensino superior, para o aporte de 7,4% da soma de todas as riquezas do país investidas em educação. Já na Coréia do Sul, o percentual reservado para o ensino superior é de 2,3%, em meio ao investimento total em educação, da ordem de 7,2% do PIB.

Cai assim o terceiro e último mito, acerca do qual o ensino superior no Brasil, especialmente o público, seria contemplado com notável deferência orçamentária, em detrimento do adequado financiamento para a educacão básica.

Ainda assim, mesmo em meio a toda conjuntura de subfinanciamento, e porque não dizer, de sonegação dos recursos necessários ao sistema educacional brasileiro, que como o já exposto, também aflige dramaticamente o ensino superior, o Presidente da República decidiu promulgar em 24 de abril de 2007, o inacreditável Decreto nº 6096, vulgo REUNI, especialmente para as universidades federais brasileiras.

Um dos aspectos mais lamentáveis acerca do REUNI, decorre do fato de ele não ser uma política pública, de Estado ou de Governo, construída socialmente para todo o sistema do ensino superior, tratando-se apenas e lamentavelmente, de um sectário e obscuro decreto.

Nunca será demais lembrar, que do ponto de vista político, decretos representam uma excrescência para o processo de afirmação dos regimes democráticos, assim como as chamadas medidas provisórias, exatamente por serem determinações emanadas do chefe do Estado, ou de outra autoridade superior, frequentemente publicadas para o atendimento dos desígnios particulares das camarilhas vinculadas ao poder. Não por outro motivo, decretos são instrumentos políticos primordiais para os ditadores de todas as épocas e latitudes.

Com efeito, não obstante a sua menoridade politica enquanto decreto, o inacreditável REUNI é uma medida sectária por seu caráter impositivo sobre um dos segmentos do ensino superior, no caso o das universidades federais, enquanto todo o subsistema da educação universitária ainda se ressente da elaboração de uma substantiva política para a sua efetiva democratização, sistematicamente obstada pela expansão mercantilista do ensino superior privado, que já em 1980 detinha 64,26% do total de 1.377.286 matrículas, contra 35,,74% das matrículas nas instituições públicas. Naquele mesmo ano, as instituições federais de ensino superior (IFES) respondiam por uma parcela de quase (e apenas!) 24% do total de matrículas.

Em 2004, após um período histórico que compreendeu a Anistia Política, o final da ditadura militar, o advento da Nova República, a Constituinte de 88, a impostura collorida, a privataria tucano-pefelista e os dois primeiros anos do governo Lula, o total de matrículas no ensino superior, segundo o INEP, aumentou para 4.163.733. Nesse montante, as matrículas dos alunos em instituições privadas subiram para 71,70%, enquanto que as matrículas nas instituições públicas encolheram para o percentual de aproximadamente 28,30%. Nas IFES, um quarto de século após o recrudescimento das lutas pela democratização social, o percentual de matrículas terminou por decrescer para 19, 24%.

Mas além de sectário, o inacreditável REUNI é fundamentalmente obscuro, na medida em que tenta se apropriar das teses democraticamente debatidas pelo movimento docente, para elaborar um discurso com aparente conveniência social, que entretanto não consegue disfarçar os seus propósitos de massificação e demolição acadêmica das universidades federais, transformando-as em escolões pós-secundários, destinadas a tapar o buraco criado pela falência da educação básica, já que passariam a oferecer cursos de graduação em coisa alguma, também chamados de “não voltados à profissionalização precoce e especializada”, bacharelados interdisciplinares, bacharelados genéricos etc.

Como desgraça pouca é bobagem, as diretrizes do decreto presidencial, que incluem a redução das taxas de evasão, ocupação de vagas ociosas e aumento de vagas de ingresso, especialmente no período noturno, deverão ser atendidas “pelo melhor aproveitamento da estrutura física e de recursos humanos existentes nas universidades federais.”

Na prática, isso significa que o quadro de subfinanciamento das universidades federais será agravado, caso elas tenham mesmo de cumprir a imposição presidencial, uma vez que não há a menor garantia da adequada dotação orçamentária, o que alias está expresso no parágrafo terceiro, Art.3ª do REUNI, o qual estabelece que “ o atendimento dos planos é condicionado à capacidade orçamentária e operacional do Ministério da Educação.”

Ficam implícitos igualmente, o escopo de intensificação do trabalho docente, já que o melhor aproveitamento de recursos humanos sugere a existência de alta ociosidade entre os professores, enquanto que o melhor aproveitamento da estrutura física premedita a superlotação de turmas para os cursos de graduação sem formação, o populismo acadêmico com o qual se pretende o “aumento de vagas de ingresso”.

Retornando ao Education at a Glance 2007, vale ainda destacar, que um dos achados mais importantes do relatório da OCDE, indica que é cada vez mais estreita a correspondência da substantiva formação universitária, com o sucesso no mercado de trabalho e como fator de proteção contra desemprego, o que torna ainda mais obscurantista e inconsequente o Decreto REUNI.

Contudo, não obstante a sua flagrante impropriedade acadêmica e social, o inacreditável REUNI, embora majoritariamente rejeitado por professores e estudantes em todo o país, encontrou surpreendente acolhimento entre setores dirigentes da UFRJ, com destaque maior para a sua Reitoria, que não apenas publicou uma cartilha com frágil consistência acadêmica e à reboque de sua promulgação, “A Universidade Necessária: o PRE-UFRJ 2008-2012”, como ainda tem se empenhado sobremaneira para a sua implementação, a despeito de sequer haver concluído o seu PDI.

Lamentavelmente porém, o processo de debates sobre o PRE-UFRJ tem sido preterido em favor de audiências públicas, eventos que no máximo testemunham a rejeição majoritária da comunidade acadêmica à sua implantação, mas que servem fundamentalmente para que a Reitoria anuncie a sua iminente aprovação no dia 18 de outubro próximo, através de deliberação do Consuni em sessão extraordinária.

Sob um encaminhamento que portanto simula a tramitação democrática e põe de lado a vocação acadêmica para a discussão e a reflexão, a Reitoria ruma resoluta para a renúncia da autonomia universitaria, em favor de um obscuro decreto governista e em estado de claro conflito com sua própria comunidade acadêmica.

Não necessitávamos desse tipo de embate e a Universidade Necessária não emergirá de um plano de reestruturação e expansão, que já nasce contaminado pela menoridade de uma concepção de educação universitária, que baixada por decreto, sequer foi premeditada para todo o sistema de ensino superior do país.

A partir de considerações pouco consistentes sobre temas como fragmentação acadêmca, escolha precoce, acesso ao ensino superior, cursos de terminalidade breve e racionalização de atividades/maximização dos resultados (entronização do taylorismo acadêmico?), além do tácito conformismo frente ao crônico quadro de subfinanciamento das IFES, e da mais completa alienação acerca da falência da educação básica, a Reitoria encerrada no seu PRE-UFRJ, ameaça mergulhar a universidade que pretende reestruturar, em uma crise de credibilidade sem precedentes.

Uma crise que nascerá do descrédito e da perda de legitimidade social, para com uma instituição promotora de simulacros da graduação universitária. Porque se for possível postular a existência de um consenso sobre ensino superior entre todas as classes sociais que habitam a intolerável desigualdade brasileira, provavelmente ele remeterá à necessidade de uma universdade pública e autônoma, contemplada constitucionalmente com os necessários recursos para a promoção do ensino e da formação da mais alta qualidade para todos os estudantes que nela ingressarem.



*Professor EEFD